segunda-feira, 26 de maio de 2008

A redução política

Guerreiro Ramos, grande sociólogo baiano escreveu um livro intitulado a "redução sociológica". Em homenagem, pois, eu cunho este, a "redução política", que é uma espécie de "continuação" do post anterior. Que vem a ser, a redução política? A redução de tudo ao poder. Foucault mesmo disse: "tudo é poder, tudo está imbuído das relações de poder". O grande problema de Foucault é que ele não nos dá alternativa: se tudo é poder, somos todos escravos, necessariamente. E a "saída" foucaultiana, de que "a nova sociedade virá da experimentação com drogas e com novas técnicas sexuais" é patética, isso nada mais é do que o revival da antiga sociedade pagã que conheceu seu fim pelo avanço do cristianismo. Para mim, a redução política é notável em pessoas que se decepcionaram com a esquerda, como eu mesmo. A primeira característica disso é a perda do senso crítico. Crítica, em grego, se diz "crisis" que significa peneirar. A primeira coisa que aparece é um senso acrítico de divinização da direita e satanização da esquerda. Isso, definitivamente, não é verdade! O mundo deve muito à esquerda, não se pode satanizá-la a torto e a direito. O próprio papa João Paulo II, um dos que contribuiu para a queda do comunismo, no seu livro Memória e Identidade, afirmou que o comunismo teve seu lado bom, em especial no chamado de atenção para a justiça.
A esquerda é idealista, ela parte do desejo de implantar o paraíso na Terra à força, mas isso em muitos casos parte do desejo ardente de justiça em muitos. A força da esquerda muitas vezes não é instigada por ideologia, ou por lavagem cerebral, mas pelo estado de injustiça no qual o mundo está e no ceticismo em relação ao que o Mistério pode fazer para resolver os problemas do mundo; pensa-se "já que Ele nada faz, tomemos em nossa mão essa tarefa". O que a experiência histórica mostra é que esse desejo de jusiça originário necessariamente se corrompe, e não é à toa que os países comunistas foram ditaduras sanguinolentas e que ceifaram a vida de 105 milhões de pessoas. O ideal (a justiça) se corrompeu em tortura, prisões, campos de concentração (os gulags), fome e morte...
E por isso o capitalismo é melhor? A "direita" individualista, egoísta e indiferente é maravilhosa? É preciso aqui muito realismo! A injustiça e a escravidão não existem no dito "mundo livre" da propaganda ocidental? Não são comercializados imoralmente embriões humanos, mulheres, órgãos e corpos humanos? No nosso "mundo livre" a ideologia não é veiculada calculadamente por meio da grande mídia? De uma certa forma não existe uma escravidão subliminar onde milhões são imolados no altar do deus mercado? Onde milhões de vidas são "refugadas" por não poderem produzir? Não é o nosso "mundo livre" que propaga o aborto, a eutanásia, a esterilização em massa, a destruição de embriões em nome da evolução da ciência (nazismo puro!)?
Diante desse quadro, se Foucault estiver certo, a única alternativa é o niilismo, o nada. E a atitude mais razoável é o suicídio. Ou a loucura! Não é à toa que Nietzsche enlouqueceu em 1888 (morreu adorando uma mula e assinando em suas cartas: "O Crucificado"). E Foucault era obstinado pela morte (além de tentar suicídio várias vezes, freqüentava as saunas de San Francisco em plena época na qual a AIDS era considerada a "peste gay" e matava em menos de um ano).
O anti-poder só pode ser o amor. Essa alternativa está no mundo há 2000 anos com o maior revolucionário que o mundo já conheceu. Diante das injustiças do mundo, já da sua época, não mandou destronar César ou destruir o Império, mas a que "cada um amasse ao outro como a si mesmo". Rapidamente, o grupo dos seus amigos se espalhou pelo Império inteiro, com o anúncio de que "Deus é amor", e de que há esperança neste mundo, apesar de todo mal. O Império os perseguiu e matou durante mais de três séculos, mas caiu de podre. Ruiu sobre o seu próprio mal. O último imperador pagão de Roma disse no final do século IV: "Tu venceste, ó galileu!". Menos de cem anos, o Império Romano se transformaria em arqueologia, enquanto que o galileu e seus amigos são uma presença que até hoje, séculos depois, atravessa e desafia a história, como a única novidade neste mundo dominado pelo egoísmo, pela indiferença e pela arrogância, oriundos, antes de tudo, pela redução de tudo, ao poder.

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