sábado, 31 de janeiro de 2009

Por quê?


Um amigo que está na França me escreveu dizendo que eu poderia, nos meus posts, evitar a referência a Deus e etc., porque isso "enfraquecia" o meu discurso. Bem, em primeiro lugar é preciso dizer que eu não estou interessado em discurso nenhum, mas somente em comunicar a minha experiência. De qualquer forma, eu fiquei pensando no porquê eu cito Deus. Por uma razão muito simples: porque se Deus existe mesmo, nossa vida não pode continuar a ser como normalmente é. Não posso viver como um órfão quando na verdade tenho um pai.
Eu gosto muito da Música One of Us, de Joan Osbourne http://br.youtube.com/watch?v=rph_-qE9C-M:

"E se Deus fosse um de nós?
[...]
Se Deus tivesse um rosto, como seria?
E você gostaria de vê-lo, se
Você tivesse que acreditar em coisas como paraíso
E em Jesus e os Santos e em todos os profetas?"

Eu só sei que eu sou absolutamente maravilhado, quase que petrificado diante do fato de que Deus se fez homem. Diante disso, é como se todas as nossas palavras, como se tudo devesse ser reduzido ao silêncio.
Esses dias, escrevendo a dissertação, eu me perguntava como é escrever diante desse fato, diante dessa Presença. A resposta me veio quando vi um ícone da Anunciação: o anjo Gabriel veio à Virgem Maria enquanto ela estava trabalhando, e não durante um transe místico. Eu gosto muito da Virgem Maria, porque ela é a carnalidade da fé, ela nos faz mergulhar na realidade, nos salva do niilismo, nos enche de esperança! O desafio da vida é viver tendo essa presença nova que entrou em nossa vida, bem diante dos nossos olhos. Por isso, ao contrário do que muitos pensam, a fé não é uma fuga da realidade, mas é uma modalidade subversiva e surpreendente de viver as coisas de sempre! E não dá para não falar do fato mais importante da História, que tem a ver com tudo, e com todos! Eu sei bem em quem eu acredito, ai de mim se não evangelizar!

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Uma imagem vale mais do que mil palavras


Ícone da Natividade

"Deus é luz!" (1 Jo 1,5) e AMA a vida!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Dançando sobre o vazio ... ou sobre o cheio?

Um dia, discutindo sobre o niilismo, um amigo me disse que agora, que a razão foi tirada de seu centro, que todo mundo desconfia da razão, resta-nos ... dançar sobre o vazio! É o que Nietzsche diz, resta-nos agora dançar sobre uma estética vazia, sobre a pura forma do nada... Isso nunca me bastou, porque eu semprei pensei que dançar sobre o vazio não tem graça, ou como diz Luís Fernando Veríssimo, "o ateísmo é tão chato como um mundo sem loiras"! Dançar sobre o nada não me atrai.
Tem um livro muito bom do jornalista italiano Vittorio Messori chamado "A fé em crise? O cardeal Ratzinger se interroga", de 1985, no qual ele interroga o então cardeal Ratzinger, hoje papa Bento XVI, sobre o catolicismo dele, e nele Ratzinger fala que, como bom filho da Baviera, o seu catolicismo não é rançoso e ranzinza, mas alegre e colorido, no qual existe espaço para a oração, mas também para a festa e para a alegria (em oposição ao protestantismo, que é comum na Alemanha, muito mais focado na observância de regras).
E aí, pensei, dado que a esperança é o inverso do niilismo, vou virar esse negócio de cabeça pra baixo! É bom dançar sim, mas por que sobre o vazio? Por que não sobre o cheio? Por que viver no desespero se eu posso esperar? Por que pensar que estou imerso no nada, quando estou imerso no Infinito, nele me movendo, existindo e sendo?
Por isso, a esperança tem um nexo profundo com a liberdade, que tem a ver com esse reconhecimento e me parece que a escolha está em nossas mãos! Ou a Grande Presença, ou o nada! Já que é pra dançar, que seja sobre o cheio, como se diz na música Keep On Rising: "Live your life, and you be free!" (Viva a sua vida e seja livre!)", dançando sobre o cheio!

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

O recado de Foucault

Uma coisa tem de ser dita: Foucault é um gênio! À medida que se avança na leitura dele, se percebe isso com uma clareza impressionante. Ele é o arqueólogo da "jaula de ferro" moderna, incomoda a direita e a esquerda porque vem revelar, trazer à tona a prisão na qual se constituiu a modernidade.
Foucault se interessa pelo poder porque é a única coisa que sobra depois que Deus é tirado de cena. Sem a percepção do Mistério, o homem é necessariamente escravo do poder, e Foucault percebe isso de uma forma genial, como poucos.
Mas a coisa que mais me impressiona em Foucault é perceber, já nos anos '60 o fenômeno da "dissolução do sujeito". De fato, a ideia de sujeito, 'eu', pessoa, começou com Abraão, em 1750 a.C. quando ele resolve seguir a Voz que o chamava à Palestina. Ele deixou o mundo politeísta na qual o 'eu' se dissolvia na comunidade, na natureza e nos tempos cíclicos; e seguiu a Voz que o chamava, o 'eu' adquire consistência diante não da 'comunidade, da 'natureza', ou dos 'tempos cíclicos', mas diante de um 'tu', de um 'outro', diante do qual ele está. Ali nasceu a percepção de 'eu' que moldou a nossa sociedade, tão cara a nós e que se manifesta entre outras coisas na democracia e na Declaração Universal dos Direitos Humanos e do Cidadão. O 'eu' é relação direta com o Mistério.
Como a percepção da relação direta com o Mistério foi podada ideologicamente por grupos que queriam supostamente 'emancipar' o homem, a percepção do 'eu', naturalmente desaparecia, sendo somente uma encruzilhada de todos os vetores do poder, poder que teria total poder sobre o indivíduo. Não é verdade que o poder domina hoje nossos pensamentos, nossa forma de nos vestirmos, de usarmos nossos corpos, o nosso modo de falar? Porque sem o reconhecimento de uma 'Outra Coisa', o 'eu' nada mais é que 'a resultante dos diversos vetores de poder' presentes sociedade, um poder que pode ser difuso ou concentrado, mas que se arroga um direito total sobre as nossas vidas. A tragédia maior acontece quando esse poder se cristaliza no Estado. Vimos isso no fenômeno dos totalitarismos nazista e comunista, onde, em nome da desculpa de moldar a sociedade perfeita, o poder se arvorou o direito de eliminar dezenas de milhões de pessoas. Sem uma referência ao Mistério Último, a defesa da pessoa perde qualquer fundamento e fica à mercê de quem detém o poder no momento. É paradoxal, mas o reconhecimento do Mistério é a única possibilidade de real liberdade e de resistência ao poder, de não ser joguete nas mãos de quem detém o poder no momento, joguete esse se faz por meio do discurso, dos meios de comunicação especialmente.
Hoje se fala muito em autenticidade, na revolta pós-moderna que pode ser a semente de um mundo novo, mas sem a referência, sem o reconhecimento do Mistério, a pós-modernidade, que pode muito bem ser o começo de um mundo novo, pode cair no mais profundo niilismo. Não se criará um homem novo e emancipado somente com o voluntarismo e com a força do discurso e da retórica. Foucault reconheceu isso com uma lucidez admirável.Como ele mesmo fala, dando o seu recado à modernidade arrogante, cínica e ateia:
"O discurso não é a vida: seu tempo não é o de vocês; nele, vocês não se reconciliarão com a morte; é possível que vocês tenham matado Deus sob o peso de tudo o que vocês disseram; mas não pensem que farão, com tudo o que vocês dizem, um homem que viverá mais que ele" (A Arqueologia do Saber, p. 236).

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Do que ainda podemos esperar?

Se alguém me perguntar qual é a minha palavra preferida, eu sei responder no ato: é a palavra ESPERANÇA. Eu sou verdadeiramente apaixonado por esta palavra, porque eu já tive uma época em minha vida (2003) na qual eu não esperava nada: dormia sem querer acordar, e acordava querendo dormir, uma sensação horrível. E isso acontecia porque no fundo eu não esperava mais nada da vida, nenhuma novidade. Nem mesmo do acontecimento cristão (a Igreja). Quando a encontrei, em 2001, eu vim de tantos momentos difíceis, de tantas apostas, que eu não me envolvi com ela de forma plena, vivia "justaposto", não conseguia fugir, mas também de fato, o meu eu, o centro da minha pessoa não apostava a vida no encontro que eu tinha feito, 2 anos antes.
Eu tenho uma certa "tara" por livros. Há alguns anos, voltando de uma viagem, cheguei no Aeroporto de Salvador, e comprei seis ou sete, de uma vez. Um dos que eu li é o único livro de poesias de Camilo Pessanha, autor português representante do Simbolismo, morto em 1926, em Macau, antiga colônia portuguesa (hoje pertencente à China), intitulado Clepsidra. Clepsidra é o nome de um antigo relógio de água. Este foi um dos livros mais belos, profundos e tristes que já li. O autor tem plena consciência do que é a vida humana, do nada que a cerca, que a traga, do vazio, do absurdo, da falta de sentido e do desespero que a cerca. Minha vida era uma Clepsidra, uma sucessão de instantes vazios e sem significados, e mais ainda: era como se eu já conhecesse tudo, como se não pudesse esperar mais nada.
Muita coisa aconteceu de lá para cá. O que é evidente em minha vida hoje é a esperança. "Um imprevisto é a nossa única esperança!", diz Luigi Giussani. O imprevisto em minha vida foi dar lugar a uma amizade que eu tinha encontrado e não tinha valorizado até então.
Eu escrevo tudo isso porque estou pensando em Gaza, na Palestina. Há esperança para este mundo? Há esperança para nós? Depois do horror, ainda há esperança? Já li um monte de análises políticas muito boas, mas isso não basta! Falar de amor de forma etérea também não me corresponde. Mandar os terroristas "relaxarem" como Mika faz em Take it easy também não dá. Há esperança de verdade, ou diante do que acontece no mundo eu só posso olhar impassível, jogar pedras ou fazer passeatas, ou pior ainda, me conformar, achando que o mundo não pode ser melhor? Meu coração não se conforma com "gritos mortos de infinito"! O mundo pode ser melhor do que é! Qualquer coisa pode ser melhor do que já é! Quem diz o contrário está contando uma mentira muito grande! Não falo em mundo perfeito, esse sim eu acho impossível, mas quem disse que não podemos tornar o mundo um lugar melhor pra se viver? Quem disse que nós não podemos ser pessoas melhores? Mas mesmo assim, não me conformava! De onde pode vir a esperança ao mundo?
Eu lembrei da minha experiência. Em 2006, eu vivi um momento muito difícil, marcado por muita dor, confusão e revolta. E digamos, "uma quase perda da fé". No fundo, eu sabia que Deus existia, mas eu queria vê-lO, não dava mais para uma fé "infantil". Era tudo ou nada ali. O que me salvou foi que durante quatro meses eu fiquei de joelho diante do Santíssimo Sacramento, dizendo: "Senhor Jesus, tem piedade de mim, que sou pecador". Até que, em novembro, em São Paulo, eu fiz um encontro que mudou a minha vida. Eu fui a São Paulo fazer uma entrevista para seleção do mestrado na Fundação Getúlio Vargas. Uma pessoa que estudou na UFBA me disse que tinha apartamento lá em São Paulo. Eu aceitei e confiei. Uma confiança "irracional". Na véspera da viagem, esta pessoa me disse que não iria poder emprestar o apartamento por uma determinada razão (que depois eu descobri qual era: não existia apartamento nenhum, era mentira pura). Eu disse "está certo", e fui. Eu já tinha um amor à Virgem Maria, e pensei: "Nossa Senhora não vai me deixar na rua". Nem eu sabia que já tinha a fé que achava que tinha perdido. Quando eu cheguei em São Paulo, pensei em quem poderia me acolher, assim, do nada. Só lembrei de uma amiga, Cristiane, de uma obra chamada Ponto Coração. Eles me acolheram dessa forma. Cheguei lá eu encontrei um francês, na época responsável da casa que me disse que eu podia ficar. Arnault é um economista francês que se tornou missionário depois do que viu em Medjugorje (Bósnia-Herzegovina) e hoje é padre na Fazenda do Natal (na Bahia), da mesma obra. Lá também eu encontrei Cristiane, Graziela e a Irmã Maria Laura, também francesa, do Verbo de Vida (Lauro de Freitas). Eu passei cinco dias nessa casa e voltei maravilhado. Fiquei pensando: "Onde é que existem pessoas assim? Quem são essas pessoas? o que existe por trás delas? Quem é que gera isso?" O fato é que eu vi Deus, se é que vocês me entendem. Eu acho que esta foi a primeira vez que a partir de um fato humano, fiz este percurso de forma tão rápida: reconhecer dentro de uma humanidade diversa que correspondia àquilo que eu mais esperava, o Mistério de Deus. Eu sei que a aridez que eu vivi por quatro meses acabou. Deus me respondeu com um fato. Os caminhos dEle são infinitos, mas ali ele me deu a fé.
A significa que dentro da nossa realidade, dentro desse mundo maluco existe uma outra coisa, existe uma outra realidade, diversa e melhor, existe um outro mundo neste mundo, e a mim - pobre ser - foi dada a graça de vê-lo. Voltei decidido a viver a experiência na qual eu vinha me justapondo durante muito tempo, a experiência que havia me sido dada. E hoje eu tenho esperança, essa esperança que é a vida da minha vida, que me faz feliz! Tenho esperança porque Jesus ressuscitou, está vivo e é Ele que gera realidades como essa pelo mundo inteiro. O mundo não está abandonado ao caos do horror, do ódio e da guerra! E nem aos fracassos da política mundial!
A única esperança para o mundo é que realidades que portam essa mentalidade, essa vida - que é o amor, não como apelo etéreo, mas como fato concreto - se dilatem ao máximo. É daí que brota a esperança para o mundo. Pois senão, a única coisa que teremos é o avanço implacável do devir, que faz ontem os judeus vítimas e os faz hoje algozes (da mesma forma que fez os negros antes escravizarem, e depois, serem escravizados). É essa mentalidade que fazia a Irmã Maria Laura, negra e de Guadalupe (território ultramarino da França) não ter ódio de Arnault (branco francês da França Continental). Toda vez que penso na guerra, me lembro deste trecho de Paulo: "Ele - Cristo - é a nossa paz, de dois povos fez um só, destruindo o muro de inimizade que os separava" (Efésios 2,14). É a única esperança para o mundo. Todo o resto ou é cálculo político-ideológico ou cinismo puro, o que é ainda pior.

domingo, 11 de janeiro de 2009

A arqueologia do ceticismo


Recentes discussões com amigos e uma das leituras que estou fazendo para a minha dissertação, A arqueologia do saber, de Michel Foucault (1926-1984), um dos maiores pensadores do século XX, me inspiraram a escrever este post sobre a arqueologia do ceticismo, tema que há bom tempo me intriga. Falo em arqueologia do ceticismo por duas razões:
1º Porque a maioria dos meus amigos que têm nível superior (e a maioria o tem, até pelo ambiente no qual eu ando), é cética.
2º Quase todas as discussões nas quais as pessoas me envolvem com relação à fé o assunto homossexualismo entra em questão. Quem me conhece sabe que eu não tenho nenhum problema, preconceito ou o que quer que seja com gays, lésbicas, total flex e afins.
Então, eu fiquei me perguntando: "se eu não saio por aí atacando (no bom sentido) gays, lésbicas, total flex e afins, por que essa de amigos heterossexuais (detalhe interessante!) estarem contra mim dessa forma, beirando muitas vezes o ódio?" A resposta é uma só: esse ataque é a única - ou a última - forma de atacar aquele é o "inatacável", Jesus Cristo. "Odiaram-me sem motivo", diz ele. E esse ataque todo é fruto de como a mídia passa a questão da sexualidade para a população.
Eu me dei conta de que entendo e respeito os céticos, mas cada vez me intrigava mais a questão. Neste mesmo espaço falei da lavagem cerebral dos jovens, em 18/09/08 http://dimitrimartins.blogspot.com/2008/09/lavagem-cerebral-nos-jovens.html, mas o detalhe é que "o buraco é mais embaixo", a lavagem cerebral anti-cristã é perpetrada em toda a sociedade, em todas as classes sociais, em todas as idades, produzindo o que o cineasta Pier Paolo Pasolini, ateu, comunista e homossexual assumido, chamou de homologação (sem trocadilhos): todo mundo pensa a mesma coisa, veste a mesma coisa, faz a mesma coisa, a exigência de autenticidade é jogada no lixo, e todo mundo repete o discurso do poder, e geralmente aqueles que se acham mais livres, a geração MTV e afins, geralmente são os mais escravizados. Vivemos hoje numa sociedade que o simples fato de ser cristão e ter fé, em si, constitui quase um crime. A ironia de tudo isso é que Foucault, em seus estudos arqueológicos, na História da Sexualidade (e na Microfísica do Poder também), afirmou que a perseguição aos homossexuais só começou por volta de 1750, com o advento da modernidade, e que a Igreja jamais perseguiu os homossexuais.
É um milagre que um jovem universitário não seja cético hoje. De dentro da Igreja, por um lado, se percebe uma relutância à missão, quase como se os católicos tivessem vergonha de o sê-lo, desconhecendo o imenso patrimônio cultural e intelectual da fé; por outro, os jovens são "preparados para o ceticismo", não só pela escola, mas pela TV, pelos pais que perderam a fé e não acham importante transmitir para os próprios filhos o sentido e o valor da vida humana. Chegamos hoje a um nível de informação monumental, sobre qualquer coisa. Mesmo sobre o massacre de Gaza, existem informações que virtualmente chegam ao infinito. O que falta hoje? O sentido de tudo isso. Estamos perdidos - como nos conta Machado de Assis já no século XIX "na barafunda da informação". A ciência já sabe hoje que informação demais emburrece, pois além da informação é necessário o pensamento e o amadurecimento da informação. Não é à toa que já na década de 2020, um dos principais problemas de saúde terão a ver com a cognição: as pessoas ficarão estressadas com a quantidadade de informações que deverão - e não conseguirão, por diversos fatores - assimilar. O pior de tudo é a falta de sentido. Qual o sentido em busca de informações nesse ritmo frenético e alucinante, ritmo que não dá tempo de elencar, reunir os pedaços e reconhecer o sentido que se oculta por trás da barafunda da informação, aparentemente sem conexão?
A falta de sentido conduz também, além do ceticismo, à banalidade. Qualquer um que visitar o orkut poderá perceber o que é o ápice da banalidade. A cultura do nada se evidencia de forma muito clara no orkut. Eu fico muito triste quando vejo pessoas adultas, cultas, estudadas, que não tem nada na cabeça, sendo pessoas vazias, fúteis, "efemeridades", diria Clarice Lispector.
Se pararmos nisso, a nossa época é realmente desesperadora. É a época do triunfo do nada. Mas eu não acredito que estamos condenados ao nada. O recurso para lutar contra esse niilismo e ceticismo não é apelar para espiritualidades de plantão new ages que desconsideram a razão e no fundo acabam incrementando o niilismo e o ceticismo, mas é voltar a olhar as nossas exigências originárias e constitutivas, é voltar a olhar o nosso próprio coração, o centro da nossa razão. A grande Adélia Prado disse: "Para o desejo do meu coração, o mar é apenas uma gota." Nosso desejo é o Infinito, então por que nos contentar com as banalidades, com as futilidades, com o nada? A Beleza salvará o mundo, como falou Dostoiévski, porque "a Beleza é a manifestação da Idéia" (Hegel), desse Infinito pelo qual aspira o nosso coração. O método, o caminho nos é dado pelo mesmo Pasolini, ateu, comunista e homossexual assumido, para ficar claro que não é uma questão de convicções religiosas, mas uma questão humana, aberta e disponível a todas as pessoas. É o caminho do olhar, do olhar a beleza que passa em nossa frente. O primeiro passo para sair do ceticismo é o reconhecimento da beleza, da beleza que vem com a correspondência. Diz Pasolini: "O olho olha... é o único que pode perceber a beleza... a beleza se vê porque é viva, e portanto real. Digamos melhor, que pode acontecer vê-la. Depende de onde ela se revela. O problema é ter os olhos e não saber ver, não olhar as coisas que acontecem. Olhos cerrados. Olhos que não vêem mais. Que não são mais curiosos. Que não esperam acontecer mais nada. Talvez porque não acreditem que a beleza exista. Mas no deserto de nossos caminhos Ela passa, rompendo o limite finito e enchendo os nossos olhos de desejo infinito".
O segundo passo é julgar, comparar a exigência que temos em nosso coração com aquilo que encontramos, com a homologação do poder e da mídia, com a banalidade e vulgaridade presente no orkut, com o niilismo e desesperança que se ensina nas escolas. Será que nosso coração se contenta com tão pouco? Será que basta tão pouco pra saciar a nossa exigência infinita de autenticidade, de verdade, de vida, de beleza, de significado? Eu sou cristão porque encontrei tudo isso em Jesus Cristo e na Sua Igreja hoje, aqui e agora! O problema, como canta Joan Osbourne, em One of Us (Um de nós), é que ninguém mais busca essa beleza, a única que nos sacia de verdade. "Ninguém O está chamando ao telefone - canta ela - somente o Papa, talvez, em Roma".

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

A mais urgente das questões

Hoje é meu aniversário, e eu estou muito surpreso comigo! Eu estou MUITO FELIZ neste últimos dias, e isso evidencia-se particularmente agora quando completo mais um ano de vida. O meu aniversário é uma data muito importante pra mim porque há poucos anos, eu não gostava de fazer aniversário, não gostava de ficar mais velho. Eu via os meus anos se evaporarem, como se fossem areia numa ampulheta, indo para nunca mais voltarem, e o pior de tudo, sem sentido algum. Nos últimos anos, e a cada ano isso é mais verdade: este ano estou mais feliz do que no ano passado, eu estou mais feliz por fazer anos, eu me sinto extremamente grato pelo fato de estar vivo (principalmente quando eu lembro das várias ocasiões nas quais me vi face-a-face com a morte - eu lembro todas as datas - desde quando eu tinha 3 anos quando fiquei gravemente doente, devo minha vida a uma promessa que minha mãe fez a São Francisco de Assis, até a última vez que me vi em perigo, em 2007), e o mais interessante, cada vez mais jovem, mais vivo, mais ativo, mais alegre, mais feliz; não que eu seja uma nova Pollyanna, tentando "ver o lado positivo de tudo", estou feliz mesmo, primeiro por que estou vivo, e segundo, que não estou sozinho - Deus está vivo e está comigo!
Estou me dando conta nos últimos tempos o quanto eu amo a vida, a minha em primeiro lugar, e de todos aqueles que me cercam. A vida não é uma coisa óbvia, a vida é preciosíssima, é rara, é um milagre, não só a vida humana, mas toda a vida. Um dia eu me lembro que uma amiga estranhou que eu chamei na rua um cão de "amigo", depois me consolei lembrando que São Francisco o chamaria de "irmão". Pensei: "ele é mais radical que eu". E fiquei em paz!
Tendo em vista tudo isso, me dou conta de que nós nos distraímos daquela que eu chamaria de "a mais urgente das questões", simplesmente essa: "que é a vida?" Estou acompanhando atentamente o que está acontecendo em Gaza, e eu sou totalmente contra o que está acontecendo lá, por uma razão muito simples: aquilo ali vai virar um massacre completo se ninguém fizer nada. Vejo, ao redor do mundo, inúmeras manifestações, passeatas, reivindicações, e penso: "será que aquelas pessoas sabem o que estão fazendo ou são conduzidas somente pela mídia? Por que esse interesse todo pelos palestinos, interesse que parece desconsiderar a existência dos terroristas do Hamas e do Hezbollah? E pior ainda: por que essa manifestação toda por Gaza e a desconsideração completa pelo que está aocontecendo em proporções muito maiores em Darfur, no Sudão?" E aí eu entendo que essas manifestações são somente ideológicas, quase ninguém de fato ama a vida de ninguém e só está se manifestando por um puro jogo político que a mim me dá nojo. Em 2001 eu fiquei enojado com pessoas militantes de movimento estudantil que estavam comemorando o ataque às Torres Gêmeas, porque era um "ataque ao coração do império!" pelo amor de Deus! Não estamos jogando WAR! A impressão que eu tenho é de que muita gente que fala isso não cresceu psicologicamente, vivendo como se estivéssemos num imenso jogo!
Mas não! Não estamos num imenso jogo, a vida de verdade é um imenso drama, impõe-se a nós, por mais que queiramos fugir para lá ou para cá, e impõe-nos uma pergunta, cujo grande risco para nós é a ruína - sob o nosso próprio olhar complacente - da nossa vida, em desespero, ódio, amargura e rancor, como vemos em nossa volta: basta abrir os olhos.
Eu sou imensamente grato pela oportunidade de estar vivo, de viver, ser chamado do nada ao ser! Vir do nada ao ser, isto não é nem um pouco óbvio! Como disse um amigo meu que está se formando em medicina, "cada minuto é um milagre!", não é nem um pouco óbvio! E a vida, das duas, uma: ou tem uma razão - logos - ou é absurda - vem do acaso, não há uma terceira alternativa. Olhando a minha vida, a forma como as coisas aconteceram e acontecem é muito evidente que existe uma razão - logos - uma razão poderosíssima - tão poderosa quanto discreta, porque respeita a nossa liberdade e a nossa inteligência (como disse S. Tomás Morus "Deus criou o homem para servi-lO na astúcia da sua inteligência" - desafiá-lO é obra de Satanás), e que não só é poderosa, como me ama, move a realidade a meu favor - providência. Sou grato a tudo o que vivi, tudo e todas as pessoas que encontrei e encontro: cada uma revela uma face do Mistério pra mim, uma face da multiforme graça de Deus. Diante de tanta graça, de tanto amor, como não se animar? Eu sempre - depois que descobri - ponho diante de mim, a frase que Machado de Assis disse antes de morrer: "a vida é boa!", ou como ele disse em Memórias Póstumas de Brás Cubas: "verdadeiramente, o único mal consiste em não nascer!", ou o saudoso amigo Bruno Tolentino, "copiando e erudizando" Machado, "a realidade é inexoravelmente positiva!", boa!
O que me deixa mais grato é o que eu chamo de "salvação", a chance de ter esperança na vida, alegria, paz, amar a mim mesmo, Àquele que me criou e me cria e àqueles que Ele coloca em meu caminho, isto é, ser feliz! O que me deixa mais feliz é a graça de ter sido escolhido e de dizer sim ao Mistério que se fez carne e é verdadeiramente, o Caminho, a Verdade e a Vida, o Mistério que anima (dá a vida) a tudo criado. O que me deixa mais grato é ter alegria num mundo no qual as pessoas são tristes, é ter esperança num mundo onde as pessoas são desesperadas, é amar num mundo no qual as pessoas se matam umas às outras, é ter amigos (em todo o Brasil, na França, na Itália e agora nos Estados Unidos) num mundo no qual as pessoas se reduzem ao mero "si mesmo" e à solidão e justaposição niilista que gera depressão e suicídio.
O meu maior desejo é que a minha vida seja útil, sirva para alguma coisa. E eu quero que ela sirva para levar vida às pessoas, levar paz, amor, esperança. Isso é o que mais me realiza, o que mais me faz feliz! Eu quero espalhar essa vida que eu encontrei e que mudou a minha vida em 180 graus. Eu não quero só entender - porque o reconhecimento do Mistério (e com ele, a humildade) é a plenitude do humano - tudo, embora entender seja justo, eu não quero só pensar - porque até um débil mental pensa (mesmo que forma truncada), eu quero viver, acima de tudo. Já disse Clarice Lispector: "não se preocupe em 'entender': viver ultrapassa qualquer entendimento!" Viver é muito mais do que entender, é muito mais do que pensar, engloba tudo, mas transcende tudo isso. A única forma de descobrir o significado da vida não é "entendendo" ou mesmo "pensando", mas vivendo mesmo, e viver significa "mergulhar no drama". Só quem resolve "mergulhar" vai conseguir responder àquela que é a mais urgente das questões. Eu fico imensamente grato quando me dou conta de que não estou só com este drama. A nossa grandeza de cristãos não é porque somos bons ou melhores que os outros, mas porque não estamos sós, podemos viver com esperança e amar porque não estamos sós, estamos com uma presença - discretíssima - mas presente que nos acompanha e que é responsável até pelas batidas do nosso coração - que está conosco e nos anima, nos dá força! Quem tiver olhos para ver, que veja! Eu só sei que é esta presença em minha vida que me faz tão feliz e mais jovem, a cada ano que passa!