quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

A palavra mais bonita de todas

Qual é a palavra mais bonita que possa existir? É a palavra "graça".
Nós só não nos damos conta disso porque somos educados numa mentalidade desumana, ou pior, inumana, que é o racionalismo positivista da nossa era moderna. Por isso, Luigi Giussani define o positivismo como a "abolição total do humano".
Mas o que seria o "humano"? O que nos define como "homens"? É a capacidade de alcançar o significado. São os animais que vivem no mundo do índice, no mundo daquilo que aparece. O positivismo não é apenas uma mera redução do humano, mas a sua abolição total, porque o positivismo é a redução de tudo o que existe à aparência, àquilo que emerge como epifenômeno. O resultado é que as pessoas hoje são extremamente superficiais, e não conseguem fazer o percurso da razão, do sinal ao seu significado, da vida ao seu sentido. Não é a vida que torna-se absurda, nós é que nos tornamos, por força do positivismo, incapazes de reconhecer o seu sentido e a sua meta.
A palavra que desaparece no meio de toda confusão que é a época moderna é a palavra "graça". Eu penso que esta é a palavra mais bonita que possa existir não por um pieguismo, mas por um realismo. Tudo o que temos, a nossa vida, em primeiro lugar, nosso corpo, nossos pais e eventuais irmãos e amigos, nossa inteligência e sensibilidade, os encontros que fazemos, tudo o que aprendemos e somos não é produzido por nós, como o positivismo irrealisticamente tenta nos mostrar, nem é uma conquista, mas nos é dado, nos é oferecido, inclusive mesmo a saúde. Nascemos, encontramo-nos no ser, temos consciência e desejos infinitos, tudo isso não é obra nossa. São realidades que encontramos, mas não as demos a nós. São graça, dom. De quem? Do Ser, no qual tudo encontra sua consistência. O píncaro desta consciência nos é evidenciado pelo Apóstolo Paulo: "N'Ele [No Ser], vivemos, existimos e somos".
O que mais me impressiona é que isto ainda não é uma questão de fé. É uma questão de uso da inteligência. O reconhecimento da absoluta gratuidade do Ser para conosco é um problema de inteligência, de uso da razão, não de fé, ainda. "O mal [que é justamente o não-reconhecimento desta dependência original do Ser] é ilógico", diz Bento XVI, porque é incoerente com o reto uso da razão.
Numa sociedade na qual as pessoas não se reconhecem como graça, como um dom do Ser, que Se doa a nós para nos conduzir à felicidade, a primeira coisa que desaparece é a gratuidade. Esta é a marca de uma sociedade burguesa: a ausência total da gratuidade, do dom. É uma sociedade marcada pelo arbítrio, pelo cálculo, pela desconfiança, pelo isolamento e pela construção de cercas cada vez mais amplas.
A única saída para tal situação é o alargamento da razão, a explosão da prisão do positivismo, a re-emergência do humano, no qual a vida e a realidade possam ser reconhecidas por aquilo que efetivamente são: caminho rumo a um destino de felicidade e de paz. Somente com o reconhecimento do mundo como um grande sinal, é que é possível o soerguimento do humano.

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