segunda-feira, 24 de maio de 2010

O baluarte contra o niilismo


Hoje, eu fui ao enterro do pai de duas grandes amigas minhas, que faleceu numa circunstância extremamente dramática. Ele foi enterrado hoje, no Cemitério Colina da Saudade, em Aracaju, tido como um "cemitério humanista". Eu o chamaria com razão de "niilista". Porque tudo nele é a tentativa de suavização do drama, no fundo, a negação da morte, e da dor, e de quebra, da vida, porque, como disse o grande Vinícius de Morais "aquele que passou pela vida e nunca sofreu, apenas passou pela vida, não viveu".

É justamente a nossa desproporção entre o nosso desejo de Infinito e a constratação da nossa finitude que geram as nossas grandes perguntas existenciais. É o nada que grita ao Ser pedindo sentido e existência, infinito. É o nivelamento por baixo, a banalização da nossa vida que tem gerado o fenômeno mais típico da pós-modernidade: a depressão, que já atinge 121 milhões de pessoas, e em 2020 será a segunda doença com maior incidência do mundo! A depressão (ou buraco, que é exatamente a "tradução" do nome desse mal-estar) é sintoma de humanidade. Para exemplificar isto, conto uma situação sui generis que aconteceu no Colina da Saudade hoje comigo. Lá, neste cemitério, os funcionários têm uma "mascote", como eu descobri, uma cadela mansa e enorme, gorda até não poder mais, dormindo a manhã inteira, sem se perguntar nada nem se incomodar com a dor alheia. Esta cadela, afável às minhas carícias, é o símbolo da humanidade moderna. As pessoas hoje se transformaram em animais, porque quem é banal é como um animal, como esta cadela, que diante de tantos dramas, não se pergunta pelo sentido da vida!

Este cemitério quer transformar cada um de nós nesta cadela gorda e sonolenta, que dorme o dia inteiro enquanto a vida passa. Mas é exatamente o drama, a ferida que nos faz reconhecer a Resposta quando ela vem! Neste ínterim, o coração é o baluarte contra o niilismo. O inimigo mais poderoso do niilismo contemporâneo é o nosso coração, são os nossos amigos deprimidos que não nos deixam em paz, que não deixam nos conformar com a banalidade pós-moderna, que clama, sem às vezes se darem conta, uma resposta aos Céus!

E a resposta vem! A resposta é a Misericórdia! Uma Misericórdia em carne e osso! Hoje eu a vi sob a forma do padre João (Giambatista Giomo), ele mesmo vítima de transtorno bipolar, com uma irmã internada com depressão na Itália. Diante do caixão do pai de nossas amigas, na hora da paz, na Missa de Corpo Presente, ele, depois de cumprimentar a família, se inclinou sobre o caixão e beijou o caixão do defunto. Ali eu vi, eu toquei a Misericórdia! Esta é a resposta de Deus aos tempos pós-modernos: uma efusão de misericórdia, porque misericóridia é a forma mais plena do amor, é o amor à miséria, amor ao nada! Que possamos ser inteligentes e saber ler os sinais dos nossos tempos e invocar para este mundo gélido e tenebroso a vinda deste amor misericordioso, que ama o nada, que ama a miséria!

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