sexta-feira, 26 de julho de 2024

Oração de Proteção

Senhor Jesus Cristo, Rei Soberano entronizado no Céu, em seu amor e misericórdia, estabeleça um perímetro de proteção com Seu Sangue Precioso ao redor de mim, de minha família, de meus amigos, de todos aqueles que estimo e de meus bens materiais e propriedades, bloqueando o poder de Satanás, de quaisquer maldições ou de qualquer outra entronização demoníaca ou tipo de abominações. Eu imploro que Tu cries ao meu redor um santuário de sua misericórdia onde Satanás e qualquer outro espírito maligno ou ação humana não possam capacitar ou ajudar de forma alguma os demônios aqui presentes, tornando-os surdos, mudos e cegos, incapazes de se comunicar ou receber qualquer poder de qualquer outro espírito maligno, isolando-os uns dos outros; que Tu os despojes de todas as armas, armaduras, poder, ilusões e autoridade; que Tu os amarrares, repreendas e os desabilites de se comunicar ou interagir uns com os outros de qualquer forma. Peço à Santíssima Virgem Maria, entronizada como Rainha do Céu e da Terra, Mãe da Igreja, Mãe Dolorosa, Virgem Poderosa e a São Miguel Arcanjo, que enviem as legiões de anjos sob seu comando para bloquear, amarrar e impedir que quaisquer demônios, seja Satanás ou qualquer um de seus asseclas, apoiem, ajudem ou se comuniquem com os demônios presentes dentro e ao redor de (N.), destruindo qualquer habilidade destes de fortificar sua fortaleza, prolongar sua permanência ou fortalecer sua habilidade de atacar ou se esconder. Peço isso em Seu Santíssimo Nome, Senhor Jesus, o Nome diante do qual todo joelho se dobrará, no céu, na terra e no inferno. Amém.

Oração de Proteção para a Tecnologia

Senhor Jesus Cristo, Rei Soberano entronizado no Céu, em Seu amor e misericórdia, estabeleça um perímetro de proteção com Seu Precioso Sangue em torno de meus dispositivos de comunicação e de toda a tecnologia usada por mim, nas câmeras ou webcams, microfones, alto-falantes, monitores, em todo e qualquer software, conexões WiFi no ar, roteadores, nos cabos ópticos envolvidos na transmissão de dados e nas ondas de luz sendo usadas para transferir dados. Limpe-os com Seu Preciosíssimo Sangue e afaste deles qualquer influência satânica. Estabeleça ao redor deles um santuário de Sua misericórdia onde Satanás e qualquer outro espírito maligno ou ação humana não possam interferir. Peço ao Pai do Céu, em nome do Senhor Jesus e pela intercessão da Mãe Dolorosa e de todos os Santos e Anjos fiéis, que bloqueie, amarre, repreenda e torne impotente qualquer ataque do maligno, por qualquer forma que pretenda vir. Pai, enquanto todos estes instrumentos forem utilizados por mim, peço que permita que eles desfrutem da proteção da Mãe Santíssima, de São José,  de todos os Santos, de São Miguel Arcanjo e todos os Santos Anjos. Peço isso no Santíssimo Nome de Jesus, o Nome diante do qual todo joelho se dobrará, no céu, na terra e no inferno, porque Jesus Cristo é o Senhor. Amém.

quinta-feira, 25 de julho de 2024

DEZ REMÉDIOS CONTRA A CONCUPISCÊNCIA

O QUE É A CONCUPISCÊNCIA 


“Todo aquele que olhar para uma mulher, desejando-a, já cometeu adultério com ela no seu coração.”

(Mt 5,28).


A luta contra a concupiscência carnal passa pela purificação do coração e pela prática da temperança. A pureza de coração permitir-nos-á ver a Deus: desde já, permite-nos ver tudo segundo Deus. A purificação do coração exige a oração, a prática da castidade, a pureza de intenção e do olhar. 


Disse Santo Agostinho: “Eu pensava que a continência dependia das minhas próprias forças, forças que em mim não conhecia. E era suficientemente louco para não saber [...] que ninguém pode ser continente, se Tu lho não concederes. E de certo Tu o terias concedido, se com gemido interior eu chamasse aos teus ouvidos e se com fé sólida lançasse em Ti o meu cuidado.”


O Apóstolo São João distingue três espécies de cupidez ou concupiscência: a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida. Em sentido etimológico, «concupiscência» pode designar todas as formas veementes de desejo humano. A teologia cristã deu-lhe o sentido particular de impulso do apetite sensível, contrário aos ditames da razão humana. O apóstolo São Paulo identifica-a com a revolta que a “carne” instiga contra o “espírito”. Procede da desobediência do primeiro pecado. Desregra as faculdades morais do homem e, sem ser nenhuma falta em si mesma, inclina o homem para cometer pecado.


No homem, porque é um ser integrado de espírito e corpo, já existe uma certa tensão. Trava-se nele uma certa luta de tendências entre o “espírito” e a “carne”. Mas esta luta, de fato, faz parte da herança do pecado, é uma consequência dele e, ao mesmo tempo, uma sua confirmação. Faz parte da experiência cotidiana do combate espiritual.


Segundo o Papa São João Paulo II, “para o Apóstolo, não se trata de desprezar e condenar o corpo que, com a alma espiritual, constitui a natureza do homem e a sua personalidade de sujeito; pelo contrário, ele fala das obras, ou antes, das disposições estáveis, virtudes e vícios, moralmente boas ou más, que são o fruto da submissão (no primeiro caso) ou, pelo contrário, da resistência (no segundo caso) à ação salvadora do Espírito Santo. É por isso que o Apóstolo escreve: ‘Se vivemos pelo Espírito, caminhemos também segundo o espírito’ (Gl 5, 25)”.


O COMBATE À CONCUPISCÊNCIA 


“Feliz o homem que suporta a tentação. Porque, depois de sofrer a provação, receberá a coroa da vida que Deus prometeu aos que o amam. Ninguém, quando for tentado, diga: “É Deus quem me tenta”. Deus é inacessível ao mal e não tenta a ninguém. Cada um é tentado pela sua própria concupiscência, que o atrai e alicia. A concupiscência, depois de conceber, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte.”

(Tiago 1,12-15)


Combater a concupiscência é tarefa árdua, mas não impossível. O Padre Antonio Royo Marin, da Ordem dos Pregadores, em sua obra "A teologia da perfeição cristã", apresenta dez "remédios" para essa missão:


  1. Mortificação: mortificar-se nas coisas lícitas, renunciando a prazeres honestos a fim de ter forças para renunciar aos ilícitos;

  2. Afeição ao sofrimento e à cruz: aproximar-se de Cristo na Cruz é também aproximar-se do Amor que será pleno no céu. Não existe meio de amar sem estar disposto a carregar a cruz e a amar os outros;

  3. Combate à ociosidade: usar o tempo para estar com Deus;

  4. Fuga das ocasiões perigosas: não dar oportunidade para a tentação carnal se manifestar. Não bastam os propósitos de não pecar, pois o corpo quer o contrário do que a alma deseja;

  5. Meditação a respeito da dignidade do cristão: considerar que todos são chamados à santidade, todos têm essa alta vocação e pensar sobre ela afasta do pecado;

  6. Lembrar que o Inferno existe: o castigo do pecado pode ser aplicado tanto pela danação eterna quanto ainda neste mundo;

  7. Recordar a Paixão de Cristo: olhando o amor com que Jesus amou a humanidade, doando-se inteiramente para salvá-la, faz com que haja uma maior resistência ao pecado;

  8. Orar de modo humilde e perseverante: para combater o pecado é preciso contar com a ajuda da graça eficaz. O pedido amoroso a Deus é fundamental para que a carne seja vencida;

  9. Devoção terna e amorosa pela Virgem Maria: Ela foi dada à humanidade como auxílio na luta contra o pecado. No dia em que pecado instalou-se no mundo, Ela foi profetizada por Deus. Maria Castíssima, Puríssima e Santíssima ajuda no combate;

  10. Frequência nos sacramentos: especialmente o da Confissão e da Eucaristia, que são escolas de santidade, importantíssimas para a verdadeira conversão. O sistema de salvação que vem pelo sacramentos foi dado por Deus para esta batalha.

ORAÇÃO DE LIBERTAÇÃO - Padre Duarte Lara

ORAÇÃO DE LIBERTAÇÃO

Padre Duarte Lara, sacerdote exorcista

«Livrai-nos do Mal» (Mt 6,13)


Introdução


O Senhor Jesus na última petição do Pai-Nosso exorta todos os seus discípulos a pedir continuamente ao Pai do Céu a libertação do Mal. Explicando o sentido desta última petição da oração do Senhor o Catecismo da Igreja Católica afirma que «nesta petição, o Mal não é uma abstração, mas designa uma pessoa, Satanás, o Maligno, o anjo que se opõe a Deus. O “Diabo” (“dia-bolos”) é aquele que “se atravessa” no desígnio de Deus e na sua “obra de salvação” realizada em Cristo» (n. 2851). «Ao pedirmos para sermos libertados do Maligno, pedimos igualmente para sermos livres de todos os males, presentes, passados e futuros, dos quais ele é autor e instigador» (n. 2854). Esta oração de libertação que se segue pede ao nosso Pai do Céu a libertação do Maligno e de todos os males dos quais ele é o autor e instigador. Pode ser rezada pedindo a Deus a libertação do influxo diabólico para si próprio ou intercedendo por uma outra pessoa.


Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.

R. Amém.


Oração de São Miguel Arcanjo 


São Miguel Arcanjo, defendei-nos neste combate, sede o nosso auxílio contra as maldades e as ciladas do demônio. Instante e humildemente vos pedimos que Deus sobre ele impere, e vós, príncipe da milícia celeste, com esse poder divino precipitai no inferno a satanás e a todos os espíritos malignos que vagueiam pelo mundo para a perdição das almas. Amém.


Leitura do Livro do Deuteronômio (Dt 18,9-12)


Quando entrares na terra que o Senhor teu Deus te dará, não aprendas a imitar as abominações daquelas nações. Que no teu meio não se encontre alguém que queime seu filho ou sua filha, nem que faça presságio, oráculo, adivinhação ou magia, ou que pratique encantamentos, que interrogue espíritos ou adivinhos, ou ainda que invoque os mortos; pois quem pratica estas coisas é abominável ao Senhor, e é por causa dessas abominações que o Senhor teu Deus as desalojará em teu favor.

Palavra do Senhor.

R. Graças a Deus.


Salmo 105 (106), 34-40


Refrão: Pela Vossa infinita misericórdia, salvai-nos Senhor.


Não exterminaram os povos,

como o Senhor lhe tinha mandado,

mas misturaram-se com os pagãos

e imitaram os seus costumes.


Prestaram culto aos seus ídolos

que foram para eles uma armadilha.

E imolaram seus filhos

e suas filhas aos demônios.


Derramaram sangue inocente

o sangue de seus filhos e filhas,

que imolaram aos ídolos de Canaã,

e o país ficou manchado de sangue.


Contaminaram-se com as suas próprias obras, prostituíram-se com seus crimes.

Por isso a ira do Senhor se inflamou

contra o seu povo.


Leitura do santo Evangelho segundo São Marcos (Mc 16,15-20):


Naquele tempo, depois de ressuscitar, disse Jesus aos Onze: «Ide por todo o mundo e anunciai a boa nova a toda a criatura. Quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado. E estes serão os sinais que acompanharão aqueles que crerem: em meu nome expulsarão demônios, falarão novas línguas, tomarão na mão serpentes e, se beberem qualquer veneno, não lhes fará mal, imporão as mãos aos doentes e estes ficarão curados». O Senhor Jesus, depois de ter falado com eles, subiu ao céu e sentou-se à direita de Deus. Então eles partiram e pregaram por toda a parte, enquanto o Senhor operava juntamente com eles e confirmava a sua palavra com os prodígios que a acompanhavam.

Palavra da salvação.

R. Glória a Vós Senhor.


N.: Renuncias a satanás e a todos os seus anjos?

R. Sim, renuncio.

Renuncias a todas as suas incitações ao pecado e à rebelião contra Deus?

R. Sim, renuncio.

Renuncias a todas as suas seduções: à magia, à feitiçaria, à bruxaria, à astrologia, à adivinhação, à invocação dos mortos, ao espiritismo, à idolatria, aos cultos satânicos, à música satânica, à superstição e a todas as formas de ocultismo?

R. Sim, renuncio.

Crês em Deus, Pai Todo-Poderoso, Criador do céu e da terra?

R. Sim, creio.

Crês em Jesus Cristo, seu único Filho, Nosso Senhor, que nasceu da Virgem Maria, padeceu e foi sepultado, ressuscitou dos mortos, está sentado à direita do Pai e virá de novo para julgar os vivos e o mortos?

R. Sim, creio.

Crês no Espírito Santo, na santa Igreja católica, na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna?

R. Sim, creio.

Esta é a nossa fé. Esta é a fé da Igreja, que nos gloriamos de professar, em Jesus Cristo, Nosso Senhor.

R. Amém.


Pai Nosso


Fiéis aos ensinamentos do Salvador ousamos dizer:


Pai nosso que estais nos Céus, santificado seja o Vosso Nome, venha a nós o Vosso Reino, seja feita a Vossa Vontade assim na terra como no Céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje, perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido e não nos deixeis cair em tentação mas livrai-nos do mal. 


Oração


Livrai-nos de todo mal e de toda a perturbação diabólica, Vós que pela morte e ressurreição de Jesus Cristo, vosso amado Filho, nos libertastes do poder das trevas e da morte e nos transferiste para o Vosso Reino de luz e santidade, libertai agora este nosso irmão N. de todo o domínio e ligação com satanás e os seus anjos. Libertai-o de todas as forças do mal, esmagai-as, destruí-as, para que o N. possa ficar bom e viver segundo a vossa santíssima Vontade. Libertai-o de todos os malefícios, das bruxarias, da magia negra, das missas negras, dos feitiços, das maldições, do mau-olhado, dos ritos satânicos, dos cultos satânicos, das consagrações a satanás. Destruí qualquer ligação com satanás e com todas as pessoas ligadas a satanás, vivas ou defuntas. Libertai-o de toda a infestação diabólica, de toda a possessão diabólica, de toda a obsessão diabólica, e de tudo aquilo que é pecado ou consequência do pecado. Destruí todos estes males no inferno para que nunca mais atormentem o N. nem nenhuma outra criatura no mundo. Deus Pai Todo-Poderoso, peço-Vos, em nome de Jesus Cristo Salvador e pela intercessão da Virgem Imaculada que ordeneis a todos os espíritos imundos, a todas as presenças que atormentam o N., a deixá-lo imediatamente, a deixá-lo definitivamente e a ir para o inferno eterno, encadeados por São Miguel Arcanjo, por São Gabriel, por São Rafael, pelos nossos Anjos da Guarda, esmagados debaixo do calcanhar da Santíssima Virgem Maria nossa Mãe Imaculada. Vós que criastes o homem à vossa imagem e semelhança na santidade e na justiça, e depois do pecado não o abandonastes, antes com sábia providência cuidastes da sua salvação pelo mistério da Encarnação, Paixão, Morte e ressurreição do Vosso muito amado Filho, salvai este vosso servo e libertai-o do mal e da escravidão do inimigo; afastai dele o espírito de mentira, soberba, luxúria, avareza, ira, inveja, gula, preguiça e de toda a espécie de maldade. Recebei-o no Vosso Reino, abri o seu coração para entender o Vosso Evangelho, para que viva sempre como filho da luz, dê testemunho da verdade e pratique obras de caridade segundo os vossos mandamentos. Com o sopro da Vossa Boca expulsai, Senhor, os espíritos malignos: ordenai que se retirem porque chegou o vosso Reino. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.

R. Amém.


O Senhor te livre de todo o mal, em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.

R. Amém.

Bendigamos ao Senhor.

R. Graças a Deus.


Com aprovação eclesiástica.

quarta-feira, 24 de julho de 2024

A maior necessidade da Igreja hoje: defender-se do Diabo

Por São Paulo VI, Papa – em 15.11.1972

1. A maior necessidade da Igreja hoje 

Quais são as maiores necessidades da Igreja hoje? A nossa resposta não parece simplista, ou precisamente supersticiosa e irrealista: uma das maiores necessidades é a defesa desse mal que chamamos de Diabo.

Antes de esclarecer o nosso pensamento, convidamos os vossos a abrirem-se à luz da fé sobre a visão da vida humana, visão que, a partir deste observatório, se estende extraordinariamente e penetra em profundidades singulares. E realmente é muito bonito o quadro que somos convidados a contemplar com realismo global. É a imagem da criação, obra de Deus, que o próprio Deus, como espelho externo da sua sabedoria e do seu poder, admirou na sua beleza substancial (cf. Gn 1,10 etc.).

2. A dramática história da humanidade 

Então é muito interessante o quadro da dramática história da humanidade, de cuja história emerge a da redenção, a de Cristo, da nossa salvação, com os seus estupendos tesouros de revelação, de profecia, de santidade, de vida elevada a um nível sobrenatural, de eterno. promessas (cf. Ef 1,10). Sabendo olhar para esta pintura, devemos necessariamente sentir-nos encantados (cf. Santo Agostinho, Solilóquios ); tudo tem um sentido, tudo tem um fim, tudo tem uma ordem e tudo nos permite vislumbrar uma Presença transcendente, um Pensamento, uma Vida e, finalmente, um Amor, para que o universo, pelo que é e pelo que é não, apresenta-se-nos como uma preparação excitante e inebriante para algo ainda mais belo e ainda mais perfeito (cf. 1Co 2,9; 13,12; Rm 8,19-23). A visão cristã do cosmos e da vida é, portanto, triunfantemente otimista; e esta visão justifica a nossa alegria e a nossa gratidão de viver com aqueles que, celebrando a glória de Deus, cantam a nossa fidelidade (cf. a Glória da Missa).

3. As deficiências que existem no mundo 

Mas esta visão está completa? É preciso? Não nos importamos nada com as deficiências que existem no mundo? Os desequilíbrios das coisas em relação à nossa existência? Dor, morte, maldade, crueldade, pecado; Em uma palavra, mal? E não vemos quanto mal existe no mundo? Principalmente quanto mal moral, isto é, simultâneo, embora de formas diferentes, contra o homem e contra Deus? Não é este um espetáculo triste, um mistério inexplicável? E não somos nós, precisamente nós, seguidores da Palavra e cantores do Bem, nós, crentes, os mais sensíveis, os mais perturbados pela observação e experiência do mal? Encontramo-la no reino da natureza, onde as suas inúmeras manifestações nos parecem revelar desordem. Depois encontramos isso na esfera humana, onde encontramos fraqueza, fragilidade, dor, morte; e algo pior, uma dupla lei oposta: uma que desejaria o bem e outra, ao contrário, orientada para o mal; o tormento que São Paulo apresenta como prova humilhante para demonstrar a necessidade e o destino de uma graça salvadora, isto é, da salvação trazida por Cristo (cf. Rom 7); O poeta pagão já tinha denunciado este conflito interno no próprio coração do homem: “ Video meliora, proboque, deteriorate sequor ” (Ovídio, Met ., 7,19). Encontramos o pecado, uma perversão da liberdade humana e uma causa profunda de morte, porque é a separação de Deus, fonte da vida (Rm 5,12); e também, por sua vez, ocasião e efeito de uma intervenção em nós e no mundo de um agente sombrio e inimigo, o Diabo.

4. O mal é um ser vivo

O mal não é apenas uma deficiência, mas uma eficiência, um ser vivo, espiritual, pervertido e pervertido. Realidade terrível. Misterioso e aterrorizante. Quem se recusa a reconhecer a sua existência sai do quadro do ensino bíblico e eclesiástico; ou quem faz dele um princípio que existe por si mesmo e que não tem, como qualquer outra criatura, origem em Deus; ou ele a explica como uma pseudorealidade, uma personificação conceitual e fantástica das causas desconhecidas de nossos infortúnios. O problema do mal, visto na sua complexidade e absurdo em relação à nossa racionalidade unilateral, torna-se obsessivo: constitui a maior dificuldade para a nossa compreensão religiosa do cosmos. Não foi sem razão que Santo Agostinho sofreu durante anos por isso: “ Quaerebam unde malum, et non erat exitus ”, procurou de onde vinha o mal, e não encontrou explicação (Confissões, VII,5,7,11 etc., PL.,22,736,739).

Aqui está, então, a importância que o conhecimento do mal adquire para a nossa justa concepção cristã do mundo, da vida, da salvação. Primeiro, no desenvolvimento da história evangélica, quem não se lembra, no início da sua vida pública, da página densa de significados da tríplice tentação de Cristo? E mais tarde, nos múltiplos episódios evangélicos, em que o Diabo se cruza no caminho do Senhor e figura nos seus ensinamentos (cf. Mt 12,43). E como não lembrar que Cristo, referindo-se três vezes ao Diabo como seu adversário, chama-o de “príncipe deste mundo”? (Jo 12,31; 14,30; 16,11). E a importância desta presença desastrosa é indicada em muitas passagens do Novo Testamento. São Paulo chama-o de “deus deste mundo” (2Co 4,4), e adverte-nos sobre a tenebrosa luta que nós, cristãos, devemos manter não com um único Demônio, mas com uma pluralidade aterrorizante: “Vistam-se, diz o apóstolo, da armadura de Deus para podermos enfrentar as ciladas do Diabo, que a nossa luta não é (só) contra o sangue e a carne, mas contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra os espíritos malignos do ar" ( Ef 6,12).

E que não se trata de um único Demônio, mas de muitas e diversas passagens evangélicas nos indicam (cf. Lc 11,21; Mc 5,9); mas um é o principal: Satanás, que significa o adversário, o inimigo; e com ele muitos, todos criaturas de Deus, mas caídos – porque eram rebeldes – e condenados (cf. DS 800-428); todo um mundo misterioso, envolto num drama muito infeliz, sobre o qual sabemos muito pouco.

Sabemos, no entanto, muitas coisas sobre este mundo diabólico que afetam as nossas vidas e toda a história humana. O Diabo está na origem do primeiro infortúnio da humanidade; Ele foi o tentador enganador e fatal do primeiro pecado, o pecado original (cf. Gn 3; Sb 1,24). Através daquela queda de Adão, o Diabo adquiriu um certo domínio sobre o homem, do qual só a redenção de Cristo poderia nos libertar. É uma história que ainda continua: recordemos os exorcismos do baptismo e as frequentes alusões na Sagrada Escritura e na liturgia ao agressivo e opressivo «poder das trevas» (cf. Lc 22,53; Col 1,13). Ele é o inimigo número um, é o tentador por excelência. Sabemos também que esse ser sombrio e perturbador realmente existe e que ainda age com astúcia traiçoeira; É o inimigo oculto que semeia erros e infortúnios na história humana. Devemos recordar a parábola reveladora da boa semente e do joio, síntese e explicação da falta de lógica que parece presidir às nossas surpreendentes vicissitudes: “ Inimicus homo hoc fecit ” (Mt 13,28). O homem inimigo fez isso. Ele é “o homicida desde o princípio... e o pai de todas as mentiras”, como o define Cristo (cf. Jo 8,44); Ele é o infiltrador sofisticado do equilíbrio moral do homem. É o encantador pérfido e astuto, que sabe insinuar-se em nós através dos sentidos, da fantasia, da concupiscência, da lógica utópica ou dos contactos sociais desordenados no jogo das nossas ações, para nele introduzir desvios, tanto mais prejudiciais quanto aparentemente se conformam às nossas estruturas físicas ou psicológicas ou às nossas aspirações instintivas e profundas.

Este capítulo sobre o Diabo e a influência que ele pode exercer, tanto sobre cada pessoa como sobre comunidades, sociedades ou acontecimentos inteiros, seria um capítulo muito importante da doutrina católica que deveria ser estudado novamente, embora hoje lhe seja dada pouca atenção. Alguns pensam que podem encontrar compensação suficiente nos estudos psicanalíticos e psiquiátricos ou nas experiências espiritualistas, hoje amplamente difundidas em muitos países. Há o medo de cair em velhas teorias maniqueístas ou em terríveis divagações fantásticas e supersticiosas.

Hoje alguns preferem mostrar-se corajosos e livres de preconceitos, tomar atitudes positivistas, emprestando então fé a tantas superstições mágicas ou populares gratuitas; ou pior ainda, abrir a própria alma – a própria alma batizada, tantas vezes visitada pela presença eucarística e habitada pelo Espírito Santo! – às experiências libertinas dos sentidos, àquelas outras deletérias dos narcóticos, bem como às seduções ideológicas dos erros da moda; Estas fissuras através das quais o Maligno pode facilmente penetrar e alterar a mentalidade humana. Não foi dito que todo pecado se deve diretamente à ação diabólica (cf Sm. Th. I,104,3); mas é, no entanto, verdade que quem não se vigia com um certo rigor moral (cf. Mt 12,45; Ef 6,11) expõe-se à influência do "mysterium iniquitatis", a que se refere São Paulo (2Ts 2,3-12), e isso torna problemática a alternativa da nossa salvação.

5. Existem sinais da presença da ação do Diabo?

Nossa doutrina torna-se incerta, pois é obscurecida pelas próprias trevas que cercam o Diabo. Mas a nossa curiosidade, despertada pela certeza da sua existência múltipla, torna-se legítima com duas questões: Existem sinais, e quais, da presença da ação diabólica? E quais são os meios de defesa contra um perigo tão insidioso?

A resposta à primeira pergunta exige muita cautela, embora os sinais do Maligno pareçam tornar-se evidentes (cf. Tert. Apo., 23). Podemos assumir a sua acção sinistra onde a mentira se afirma hipocritamente e poderosamente contra a verdade evidente; onde o amor é eliminado por um egoísmo frio e cruel; onde o nome de Cristo é contestado com ódio consciente e rebelde (cf. 1Co 16,22; 12,3); onde o espírito do Evangelho é mistificado e negado; onde o desespero é afirmado como a última palavra, etc. Mas é um diagnóstico demasiado amplo e difícil, que não pretendemos agora aprofundar e autenticar, mas não carece de um interesse dramático, ao qual a literatura moderna também dedicou páginas célebres (cf. por exemplo, as obras de Bernanos, estudado por Ch. Möeller, Literatura do século XX, I., p. 397 e seguintes; P. Macchi, A face do mal em Bernanos; cf também Satan, Carmelitan Studies, Desclee de Brouber, 1948). O problema do mal continua a ser um dos maiores e permanentes problemas do espírito humano, mesmo depois da resposta vitoriosa dada pelo próprio Jesus Cristo. “Sabemos, escreve o evangelista São João, que nascemos de Deus e que o mundo inteiro está submetido ao Maligno” (1Jo 5,19).

À outra pergunta sobre qual defesa, qual remédio para se opor à ação do Diabo, a resposta é mais fácil de formular, embora ainda seja difícil de atualizar. Poderíamos dizer que tudo o que nos defende do pecado nos defende do inimigo invisível. A graça é a defesa decisiva. A inocência assume um aspecto de força. E da mesma forma, cada um recorda até que ponto a pedagogia apostólica simbolizou na armadura do soldado as virtudes que podem tornar o cristão invulnerável (cf. Rm 13,12; Ef 5,11; 1Ts 5,8). O cristão deve ser militante; ele deve estar vigilante e forte (1Pd 5,8); e às vezes deve recorrer a algum exercício ascético especial para afastar certas incursões diabólicas. Jesus ensina-o indicando o remédio “na oração e no jejum” (Mc 9,29). E o apóstolo sugere a linha principal a seguir: «Não vos deixeis vencer pelo mal, mas vencei o mal com o bem» (Rm 12,21; Mt 13,29).

Conhecendo, portanto, as atuais adversidades em que hoje se encontram as almas, a Igreja e o mundo, tentaremos dar sentido e eficácia à habitual invocação da nossa oração principal: "Pai Nosso... livrai-nos do mal"!

A predestinação de São José e sua eminente santidade

Extrato do livro A mãe do Salvador e a nossa vida interior.

Autor: Padre Réginald Garrigou-Lagrange (Ordem dos Pregadores)

Qui minor est inter vos, hic major est¹.

 

Não é possível escrever um livro sobre a Santíssima Virgem sem falar da predestinação de São José, de sua eminente dignidade e perfeição, do caráter próprio de sua missão excepcional, de suas virtudes e de seu papel atual para a santificação das almas. Sua preeminência sobre todos os outros santos é cada vez mais afirmada na Igreja. A doutrina segundo a qual São José é o maior dos santos depois de Maria tende a se tornar uma doutrina comumente admitida na Igreja. Ela não teme declarar o humilde carpinteiro superior em graça e em beatitude aos patriarcas, a Moisés, aos maiores profetas, a São João Batista, e ainda aos Apóstolos, a São Pedro, a São João, a São Paulo, e com mais forte razão superior em santidade aos maiores mártires e aos maiores doutores da Igreja. O menor, pela profundeza de sua humildade, é, em razão da conexão das virtudes, o maior pela elevação da sua caridade: Qui minor est inter vos, hic major est; quem é o menor entre vós, este é o maior. Essa doutrina foi ensinada por Gerson² e por São Bernardino de Sena³; tornou-se cada vez mais corrente a partir do século XVI e foi admitida por Santa Teresa, pelo dominicano Isidoro de Isolanis, que parece ter escrito o primeiro tratado sobre São José⁴, por São Francisco de Sales, por Suárez⁵, posteriormente por Santo Afonso de Ligório⁶ e, mais recentemente, pelo Cônego Sauvé⁷, pelo Cardeal Lépicier⁸ e por Monsenhor Sinibaldi⁹; toda essa doutrina está muito bem exposta no Dictionnaire de Théologie Catholique, no artigo José (São), por M. A. Michel. 


Ademais, essa doutrina recebeu a aprovação do Papa Leão XIII em sua encíclica Quamquam pluries, de 15 de agosto de 1899, escrita para proclamar o patrocínio de São José sobre a Igreja universal. Nela está dito: “Certamente a dignidade de Mãe de Deus é tão elevada que não pode haver uma maior. Mas, não obstante, como São José esteve unido à Bem-aventurada Virgem pelo vínculo matrimonial, não há dúvida que se aproximou, mais que qualquer outra pessoa, dessa dignidade supereminente pela qual a Mãe de Deus supera de tão alta todas as naturezas criadas. A união matrimonial constitui, com efeito, a maior de todas e, em razão de sua própria natureza, é acompanhada da comunicação recíproca dos bens dos esposos. Se, então, Deus deu São José por esposo à Virgem, deu-o certamente não só como companheiro na vida, como testemunha de sua virgindade e guardião de sua honra, mas também fê-lo participar ― pelo próprio vínculo conjugal ― da eminente dignidade que ela havia recebido¹⁰. Ao dizer Leão XIII que São José se aproximou mais que ninguém da dignidade supereminente da Mãe de Deus, pode-se deduzir que ele está, na glória, acima de todos os anjos? Não se pode afirmar com certeza; contentemo-nos em expressar a doutrina cada vez mais admitida na Igreja, dizendo: São José é o mais elevado de todos os santos no Céu, depois de Jesus e Maria; ele está entre os anjos e os arcanjos. Na oração “A cunctis”¹¹, a Igreja nomeia São José imediatamente após Maria e antes dos Apóstolos. Se não é mencionado no Cânon da Missa, não só tem um prefácio próprio, mas o mês de março lhe é consagrado como o protetor e defensor da Igreja universal. A ele, num sentido muito real, ainda que oculto, foi especialmente confiada a multidão dos cristãos de todas as gerações que se sucedem. É o que expressam as belas ladainhas aprovadas pela Igreja e que resumem as suas prerrogativas: “São José, ilustre descendente de David, luz dos Patriarcas, Esposo da Mãe de Deus, casto guarda da Virgem, nutrício do Filho de Deus, zeloso defensor de Jesus, chefe da Sagrada Família; José justíssimo, castíssimo, prudentíssimo, fortíssimo, obedientíssimo, fidelíssimo, espelho de paciência, amante da pobreza, modelo dos trabalhadores, honra da vida de família, guardião das virgens, amparo das famílias, consolação dos infelizes, esperança dos enfermos, patrono dos moribundos, terror dos demônios, protetor da santa Igreja”. Ninguém é tão excelso depois de Maria.


A razão dessa preeminência


Qual é o princípio dessa doutrina cada vez mais admitida desde há cinco séculos? O princípio invocado de forma cada vez mais explícita por São Bernardo, São Bernardino de Sena, Isidoro de Isolanis, Suárez e outros autores mais recentes é um princípio tão simples quanto elevado; foi formulado por Santo Tomás a propósito da plenitude de graça em Jesus e da santidade de Maria. Resume-se brevemente da seguinte forma: Uma missão divina excepcional requer uma santidade proporcionada. Esse princípio explica porque a Santa Alma de Jesus, estando unida pessoalmente ao Verbo, à fonte de todas as graças, recebeu a plenitude absoluta de graça, que devia transbordar sobre nós, segundo as palavras de São João: “De plenitudine ejus omnes accepimus”¹². Essa é também a razão pela qual Maria, chamada a ser Mãe de Deus, recebeu desde o instante de sua concepção uma plenitude inicial de graça que já ultrapassou a graça final de todos os santos reunidos. Estando mais próxima da fonte de toda graça, ela deveria beneficiar-se disso mais que qualquer outra criatura¹³. Essa é, pois, a razão pela qual os Apóstolos, mais próximos de Nosso Senhor que os santos que vieram em seguida, conheceram mais perfeitamente os mistérios da fé. Para pregar infalivelmente o Evangelho ao mundo, eles receberam em Pentecostes uma fé eminentíssima, claríssima e inabalável, princípio e base de seu apostolado¹⁴.


Esse mesmo princípio explica também a preeminência de São José sobre todos os outros santos. Para bem entendê-lo, deve-se notar que as obras de Deus, que provêm diretamente d’Ele, são perfeitas. Não se poderia encontrar nelas desordem ou mesmo imperfeição. Assim aconteceu na obra divina no dia da criação, desde as mais altas hierarquias angélicas até as criaturas mais ínfimas¹⁵. Assim ainda é com os grandes servidores de Deus que Ele mesmo escolhe, excepcional e imediatamente, sem a intermediação de nenhuma escolha humana, e que são suscitados por Ele para restaurar a obra divina perturbada pelo pecado. No princípio anteriormente enunciado, todas as palavras devem ser ponderadas e meditadas: “Uma missão divina excepcional requer uma santidade proporcionada”. Não se trata de missão humana, por mais elevada que seja, nem de missão angélica, mas de uma missão propriamente divina, e não de uma missão ordinária, mas tão excepcional, que no caso de São José, é única no mundo em todo o transcurso dos tempos.


Compreende-se melhor ainda a verdade desse princípio, tão simples quanto elevado, quando se considera, por contraste, como são feitas costumeiramente as escolhas humanas. Os homens escolhem frequentemente, para as mais altas funções de um governo difícil, os incapazes, os medíocres, os imprudentes. Tal atitude leva o país à ruína, se não houver uma salutar reação. Não se encontra nada semelhante naqueles que são imediatamente escolhidos pelo próprio Deus e preparados por Ele para serem seus ministros excepcionais na obra da Redenção. O Senhor lhes dá uma santidade proporcionada, porque Ele realiza todas as coisas com medida, força e suavidade. Como a Santa Alma de Jesus recebeu, desde o instante de sua concepção, a plenitude absoluta de graça, a qual não aumentou posteriormente; como Maria, desde o instante de sua concepção imaculada, recebeu uma plenitude inicial de graça que era já superior à graça final de todos os santos e que não cessou de aumentar até sua morte; assim também, e guardadas as proporções, São José recebeu uma plenitude relativa de graça proporcionada à sua missão, uma vez que foi direta e imediatamente escolhido, não pelos homens, nem por nenhuma criatura, mas por Deus mesmo e por Ele somente, para essa missão única no mundo. Não se pode precisar em qual momento ocorreu a santificação de São José, mas tem-se o direito de afirmar que, em virtude de sua missão, foi confirmado na graça desde seu matrimônio com a Santíssima Virgem¹⁶.


A qual ordem pertence a missão excepcionalíssima de São José?


É evidente que a missão de São José ultrapassa a ordem da natureza; não só da natureza humana, mas também da natureza angélica. Seria ela unicamente da ordem da graça, como a de São João Batista, que preparou as vias da salvação, como a missão universal dos Apóstolos na Igreja para a santificação das almas ou como a missão especial dos fundadores de ordens religiosas? Se observarmos atentamente, veremos que a missão de São José ultrapassa a ordem mesma da graça e culmina, por seu termo, com a ordem hipostática constituída pelo próprio mistério da Encarnação. Mas devemos entendê-la bem, evitando qualquer exagero e qualquer diminuição.


A ordem hipostática limita-se à missão única de Maria, a Maternidade Divina, e também, em certo sentido, à missão oculta de São José. Esse ponto de doutrina é afirmado cada vez mais explicitamente por São Bernardo, São Bernardino de Sena, pelo dominicano Isidoro de Isolanis, por Suárez e por vários autores recentes. São Bernardo disse de São José: “Ele foi o servidor fiel e prudente que o Senhor constituiu como sustentáculo de sua Mãe, o pai nutrício de sua carne e o único cooperador fidelíssimo na Terra do grande desígnio da Encarnação”¹⁷. São Bernardino de Sena escreveu: “Quando Deus escolhe alguém por graça para uma missão sublime, concede-lhe todos os dons necessários para essa missão. É o que se verificou eminentemente em São José, o pai nutrício de Nosso Senhor Jesus Cristo e esposo de Maria...”¹⁸.


Isidoro de Isolanis coloca igualmente a vocação de São José acima da dos Apóstolos; ele observa que a vocação dos Apóstolos tem por fim pregar o Evangelho, iluminar as almas e reconciliá-las, mas a vocação de São José está mais intimamente relacionada ao Cristo mesmo, uma vez que ele é o esposo da Mãe de Deus, o pai nutrício e o defensor do Salvador¹⁹. Suárez disse também: “Certos ofícios exigem a ordem mesma da graça santificante e, nesse gênero, os Apóstolos tiveram o grau mais elevado; também tiveram necessidade de mais socorros gratuitos que os outros, sobretudo no que concerne aos dons gratuitamente dados e à sabedoria. Mas existem outros ofícios que confinam com a ordem da união hipostática, em si mais perfeita, como se vê claramente da Maternidade Divina na bem-aventurada Virgem Maria, e é a essa ordem de ofícios que pertence o ministério de São Jos锲⁰.


Há alguns anos, Monsenhor Sinibaldi, Bispo titular de Tiberíades e secretário da Sagrada Congregação dos Estudos, detalhou esse ponto da doutrina. Apontou que o ministério de São José pertence, em certo sentido, por sua finalidade, à ordem hipostática: não quer dizer que São José tenha intrinsecamente cooperado, como instrumento físico do Espírito Santo, no cumprimento do mistério da Encarnação; desse ponto de vista, seu papel é muitíssimo inferior ao de Maria, Mãe de Deus; mas, enfim, foi predestinado a ser, na ordem das causas morais, o guardião e custódio da virgindade e da honra de Maria e, ao mesmo tempo, o pai sustentador e protetor do Verbo feito carne. “Sua missão pertence, por seu fim, à ordem hipostática, não por uma cooperação intrínseca, física e imediata, mas por uma cooperação extrínseca, moral e mediata (por Maria); o que é ainda, no entanto, uma verdadeira cooperação”²¹.


A predestinação de São José foi simultânea ao decreto mesmo da Encarnação


O que acabamos de dizer aparece mais claramente ainda se considerarmos que o decreto eterno da Encarnação não se refere somente à Encarnação em geral, com abstração das circunstâncias de tempo e lugar, mas à Encarnação hic et nunc, aqui e agora, quer dizer, à Encarnação do Filho de Deus que, em virtude da operação do Espírito Santo, teve de ser concebido num determinado instante pela Virgem Maria, unida a um homem da casa de David, chamado José, “Missus est angelus Gabriel a Deo in civitatem Galileae, cui nomen Nazareth, ad virginem desponsatam viro, cui nomen erat Joseph, de domo David”²² ― “Foi enviado por Deus o anjo Gabriel a uma cidade da Galiléia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um varão, que se chamava José, da casa de Davi”. Tudo leva, pois, a pensar que José foi predestinado a ser o pai nutrício do Verbo feito carne antes de ser predestinado para a glória. A razão é que a predestinação de Cristo como homem à filiação divina natural é anterior à de qualquer homem eleito, porque Cristo é o primeiro dos predestinados²³. Ora, a predestinação de Cristo à filiação divina natural não é outra coisa que o decreto mesmo da Encarnação, o qual se refere à Encarnação a realizar-se hic et nunc. Esse decreto implica por si mesmo a predestinação de Maria à Maternidade Divina e a de São José para ser o pai nutrício e protetor do Filho de Deus feito homem.


Assim como a predestinação de Cristo à filiação divina natural é superior à sua predestinação à glória e a precede, como o admitem os tomistas²⁴, e como a predestinação de Maria à Maternidade Divina precede (in signo priori) sua predestinação à glória, como vimos no início desta obra, assim também a predestinação de José para ser o pai nutrício do Verbo feito carne precede para ele a predestinação à glória e à graça. Em outros termos: José foi predestinado ao mais alto grau de glória depois de Maria, e em seguida, ao mais alto grau de graça e de caridade, porque foi chamado a ser o digno pai nutrício e protetor do Homem Deus. Assim se vê a sublimidade da sua missão única no mundo, uma vez que sua predestinação primeira é simultânea com o decreto mesmo da Encarnação. Isso é o que se quer dizer correntemente quando se afirma que José foi criado e posto no mundo para ser o pai nutrício do Verbo feito carne, e para que fosse um digno pai, Deus quis para ele um altíssimo grau de glória e de graça.


O caráter próprio da missão de São José


Esse ponto é admiravelmente exposto por Bossuet no primeiro panegírico desse grande santo (3º ponto), quando nos diz: “Entre todas as vocações, chamo a atenção para duas que, nas Escrituras, parecem diretamente opostas: a primeira, a dos Apóstolos; a segunda, a de São José. Jesus foi revelado aos Apóstolos para que O anunciassem a todo o universo: foi revelado a José para que O silenciasse e O ocultasse. Os Apóstolos são as luzes para mostrar Jesus Cristo ao mundo. José é um véu para cobri-Lo, e sob esse véu misterioso se nos oculta a virgindade de Maria e a grandeza do Salvador das almas... Quem glorifica os Apóstolos pela honra da pregação, glorifica São José pela humildade do silêncio”. A hora da manifestação do mistério da Encarnação ainda não havia chegado; essa hora teve de ser preparada por trinta anos de vida oculta.


A perfeição consiste em fazer o que Deus quer, cada um segundo sua vocação; mas no silêncio e na obscuridade, a vocação de José supera a dos Apóstolos, porque toca mais proximamente o mistério da Encarnação redentora. José, depois de Maria, esteve mais próximo que ninguém do autor da graça, e no silêncio de Belém, durante a sua estada no Egito e na casinha de Nazaré, recebeu mais graças que nenhum outro santo jamais receberá. Sua missão foi dupla. Em relação à Virgem Maria, preservou sua virgindade contraindo com ela um verdadeiro matrimônio, mas absolutamente santo. O anjo do Senhor lhe disse: “José, filho de Davi, não temas receber em tua casa Maria, tua esposa, porque o que nela foi concebido é (obra) do Espírito Santo”²⁵. Maria é certamente sua esposa; é um verdadeiro matrimônio, como explica Santo Tomás²⁶, mostrando suas conveniências: nenhuma suspeita devia ocorrer, por menor que fosse, quanto à honra do Filho e a da Mãe; se alguma vez essa honra estivesse em causa, José, o testemunho mais autorizado e menos suspeito, estaria lá para atestar-lhe a integridade e a pureza. Maria, ademais, encontrou em José ajuda e proteção. Ele a amava com um amor mais puro, mais devotado, com um amor teologal, pois a amava em Deus e para Deus. Era a união sem mancha mais respeitosa com a criatura mais perfeita que já existiu, na situação mais humilde, a de um pobre artesão de aldeia. José aproximou-se, então, mais intimamente que qualquer outro santo daquela que é a Mãe de Deus e a Mãe espiritual de todos os homens, do próprio José, e a distribuidora de todas as graças. A beleza de todo o universo não é nada comparada à beleza sublime da união dessas duas almas; união criada pelo Altíssimo, que encantava os anjos e alegrava o próprio Senhor.


Em relação ao Verbo feito carne, José velou por Ele, protegeu-O e contribuiu para Sua educação humana. Chamam-no de pai nutrício, ou melhor, de pai adotivo de Nosso Senhor, mas esses nomes não podem expressar plenamente essa relação misteriosa e plena de graça. É acidentalmente que um homem se torna pai adotivo ou pai nutrício de uma criança, enquanto que não foi acidentalmente que José se tornou pai nutrício do Verbo feito carne; ele foi criado e veio ao mundo para isso; esse foi o objeto primeiro de sua predestinação e a razão de todas as graças que recebeu. Bossuet exprime-o admiravelmente²⁷: “Quando a natureza não dá um coração paternal, onde ir buscá-lo? Numa palavra, São José, não sendo pai, como teria um coração de pai para Jesus? É aí que devemos entender que o poder divino interveio nessa obra. É por um efeito desse poder que José teve um coração de pai, e, se a natureza não proporcionou isso a ele, Deus lhe fez um com sua própria mão. Porque d’Ele está escrito que muda as inclinações para onde Lhe apraz... Ele dá um coração de carne a alguns quando os abranda pela caridade... Não dá a todos os fiéis, não um coração de escravo, mas de criança, quando lhes envia o Espírito de seu Filho? Os Apóstolos tremiam diante do menor perigo, mas Deus lhes fez um coração novo e sua coragem tornou-se invencível... Foi essa mesma mão que fez um coração de pai em José e um coração de filho em Jesus. Por isso Jesus obedecia e José n’Ele mandava sem temor. E de onde lhe vem essa ousadia de mandar em seu Criador? É que o verdadeiro Pai de Jesus Cristo, esse Deus que o engendra desde toda a eternidade, tendo escolhido o divino José para servir de pai no tempo ao Seu Filho único, fez de algum modo correr em seu seio um raio ou uma centelha desse amor infinito que Ele tem por Seu Filho, e mudou-lhe o coração, e deu-lhe um amor de pai; tanto que o justo José sente em si mesmo um coração paternal, formado de uma vez pela mão de Deus; sente também que Deus lhe ordenou usar da autoridade paternal e ousa efetivamente comandar Aquele a quem reconhece por seu Mestre”. Isso equivale a dizer que José foi predestinado primeiro para “servir de pai ao Salvador; pai que não podia ter na Terra”, e, em segundo lugar, predestinado a todos os dons que lhe foram concedidos para que fosse digno protetor do Verbo feito carne²⁸. 


Após isso, é necessário dizer com qual fidelidade José guardou o tríplice depósito que lhe tinha sido confiado: a virgindade de Maria, a pessoa de Jesus Cristo e o segredo do Pai Eterno ― o da Encarnação de Seu Filho, segredo guardado até que chegou a hora da manifestação desse mistério²⁹. Sua Santidade o Papa Pio XI, num discurso pronunciado na sala consistorial no dia da festa de São José, em 19 de março de 1928, dizia, depois de ter falado da missão de João Batista e da de São Pedro: “Entre essas duas missões, aparece a de São José, missão recolhida, calada, quase despercebida, desconhecida, que não devia iluminar-se senão alguns séculos mais tarde; um silêncio ao qual devia suceder, sem dúvida, mas muito tempo depois, um retumbante canto de glória. E de fato, ali onde é mais profundo o mistério, mais espessa a noite que o encobre; quanto maior o silêncio, é justamente ali que está a mais elevada missão, o mais brilhante cortejo das virtudes exigidas e dos méritos chamados, por uma feliz necessidade, a fazer-lhes eco. Missão única e altíssima essa de custodiar o Filho de Deus, o Rei do mundo, a missão de guardar a virgindade e a santidade de Maria. Missão única a de poder participar do grande mistério escondido aos olhos dos séculos e de cooperar assim na Encarnação e na Redenção!” Equivale a dizer que é em vista dessa missão única que a Providência concedeu a José todas as graças que ele recebeu; em outros termos: José foi predestinado primeiramente a servir de pai ao Salvador e, posteriormente, à glória e à graça que convinham a uma tão excepcional vocação.


Virtudes e dons de São José


Brilham nele, sobretudo, as virtudes da vida oculta, em grau proporcionado ao da graça santificante: a virgindade, a humildade, a pobreza, a paciência, a prudência, a fidelidade ― que não pode ser quebrantada por nenhum perigo ― a simplicidade, a fé esclarecida pelos dons do Espírito Santo, a confiança em Deus e a mais perfeita caridade. Guardou o depósito que lhe foi confiado com uma fidelidade proporcionada ao preço desse tesouro inestimável. Cumpriu o preceito: Depositum custodi, guarda o que te foi confiado. Sobre essas virtudes da vida oculta, Bossuet faz estas considerações gerais³⁰: “É um vício comum nos homens entregar-se inteiramente às coisas exteriores e desprezar o interior; trabalhar para as aparências e adornos e menosprezar o efetivo e o sólido; preocupar-se com fazer parecer e não com o que deve realmente ser. Por isso são estimadas as virtudes que envolvem negócios e ocupações e exigem o trato com a sociedade; ao contrário, as virtudes ocultas e interiores, que não levam em conta o público, onde tudo se passa entre Deus e a alma, não só não são praticadas, mas não são sequer compreendidas. E, não obstante, nesse segredo reside todo o mistério da virtude verdadeira... É preciso formar um homem em seu verdadeiro sentido antes de pensar que lugar ocupará entre os outros; e se não se trabalhar sobre essa base, todas as outras virtudes, por mais brilhantes que possam ser, não serão mais que virtudes de vã ostentação... elas não formam o homem segundo o coração de Deus. Ao contrário, José, homem simples, buscou a Deus; José, homem desprendido, encontrou a Deus; José, homem reservado, desfrutou de Deus”.


A humildade de José consolidou-se ao considerar a gratuidade de sua vocação excepcional. Ele deve ter dito a si mesmo muitas vezes: por que o Altíssimo me deu Seu Filho Unigênito para custodiá-Lo, a mim, José, antes que a este ou àquele outro homem da Judeia, da Galileia, ou de outra região e de outro século? Foi unicamente o beneplácito de Deus, beneplácito que é por si mesmo a razão e o motivo pelo qual José foi livremente preferido, escolhido e predestinado desde toda a eternidade, antes deste ou daquele outro homem, a quem o Senhor poderia ter concedido os mesmos dons e a mesma fidelidade para prepará-lo para essa excepcional missão. Vemos nessa predestinação um reflexo fiel da gratuidade da predestinação de Cristo e de Maria. O conhecimento do valor dessa graça e de sua gratuidade absoluta, longe de prejudicar a humildade de José, confirmou-a. Ele pensava em seu coração: “O que tens que não recebeste?”. José aparece como o mais humilde de todos os santos depois de Maria; mais humilde que qualquer um dos anjos; e se é o mais humilde, é por isso mesmo o maior de todos, porque todas as virtudes estando conexas, a profundeza da humildade é proporcionada à elevação da sua caridade, como a raiz da árvore é tanto mais profunda quanto mais alta ela é: “Aquele dentre vós todos que é o menor”, disse Jesus, “este será o maior”³¹. Como nota ainda Bossuet: “Possuindo o maior dos tesouros por uma graça extraordinária do Pai Eterno, José, longe de vangloriar-se desses dons ou de revelar as suas vantagens, oculta-se o quanto pode dos olhos dos mortais, desfrutando pacificamente com Deus do mistério que lhe é revelado e das riquezas infinitas que o Altíssimo colocou a seu encargo”³². “José tem em sua casa motivos para atrair todos os olhares da Terra, e o mundo não o conhece; possui um Deus Homem, e não diz nenhuma palavra; é testemunho de um mistério tão extraordinário, e o aprecia em segredo, sem o divulgar”³³.


Sua fé é inquebrantável, apesar da obscuridade do mistério inesperado. A palavra de Deus transmitida pelo anjo esclarece-lhe a concepção virginal do Salvador: José poderia ter hesitado em acreditar em algo tão extraordinário, mas acreditou firmemente com a simplicidade de seu coração. Por sua simplicidade e humildade, ele ascende às alturas de Deus. A obscuridade não tarda em reaparecer: José era pobre antes de ter recebido o segredo do Altíssimo, mas tornou-se ainda mais pobre ― observa Bossuet ―  quando Jesus veio ao mundo, porque Ele veio com Sua abnegação e desprendimento de tudo para unir-Se a Deus. Não há lugar para o Salvador no último dos albergues de Belém. José deve ter sofrido ao ver que não tinha nada para oferecer a Maria e a seu Filho. Sua confiança em Deus manifestou-se nas provações, pois a perseguição começou logo após o nascimento de Jesus. Herodes pretendia matá-Lo. O chefe da Sagrada Família devia esconder Nosso Senhor, partir para um país distante, onde ninguém o conhecia e onde não sabia como poderia ganhar a vida. Partiu, colocando toda a sua confiança na Providência. Seu amor a Deus e às almas não cessa de crescer na vida oculta de Nazaré, pela influência constante do Verbo feito carne, o foco de graças sempre novas e sempre mais elevadas para as almas dóceis, que colocam toda a sua confiança em Deus e não põem nenhum obstáculo às graças que Ele lhes quer dar. Dissemos antes, a propósito do progresso espiritual em Maria, que a ascensão dessas almas é uniformemente acelerada, quer dizer, que se dirigem tanto mais rapidamente para Deus quanto mais se aproximam d’Ele e Deus as atrai mais a Si. Essa lei da gravitação espiritual das almas realizou-se exatamente em José; a caridade não parou de aumentar nele, sempre mais prontamente até sua morte; o progresso de seus últimos anos foi mais acelerado que o dos primeiros anos, porque encontrando-se mais perto de Deus, era mais fortemente atraído por Ele.


Com as virtudes teologais, cresceram também incessantemente nele os sete dons do Espírito Santo, que são conexos com a caridade. Os dons de inteligência e de sabedoria tornavam sua fé viva cada vez mais penetrante e deleitável. Com fórmulas extremamente simples, mas muito elevadas, sua contemplação dirigia-se à infinita bondade do Altíssimo. Essa foi, em sua simplicidade, a contemplação sobrenatural mais sublime depois da de Maria. Essa contemplação amorosa lhe era muito doce, mas exigia a mais perfeita abnegação e o mais doloroso dos sacrifícios, quando recordava as palavras do velho Simeão: “Este menino será um sinal de contradição”, e as dirigidas a Maria: “Uma espada de dor transpassará a tua alma”. A aceitação do mistério da Redenção por meio do sofrimento apareceu para José como a consumação dolorosa do mistério da Encarnação, e ele necessitava de toda a generosidade do seu amor para oferecer a Deus, em sacrifício supremo, o Menino Jesus e sua Santíssima Mãe, a quem amava infinitamente mais que sua própria vida. A morte de São José foi uma morte privilegiada; assim como a da Santíssima Virgem, foi ― disse São Francisco de Sales ― uma morte de amor³⁴. O santo admite também, com Suárez, que José estava entre os santos que, segundo São Mateus³⁵, ressuscitaram após a Ressurreição de Nosso Senhor e manifestaram-se na cidade de Jerusalém; ele argumenta que essas ressurreições foram definitivas e que José entrou no Céu em corpo e alma. Santo Tomás é muito mais reservado sobre esse ponto: depois de ter admitido que as ressurreições que se seguiram à de Jesus foram definitivas³⁶, mais tarde, examinando as razões contrárias aduzidas por Santo Agostinho, concluiu que estas são muito mais sólidas³⁷.


O papel atual de São José para santificação das almas


Quanto mais humilde e oculta foi a vida do simples carpinteiro aqui na Terra, tanto mais está glorificado no Céu. Aquele a quem o Verbo feito carne esteve “submetido” aqui na Terra conserva no Céu um poder de intercessão incomparável. O Papa Leão XIII, na encíclica Quamquam pluries, encontrou na missão de São José em relação à Sagrada Família “as razões pelas quais ele é o patrono e protetor da Igreja Universal... Do mesmo modo que Maria, a Mãe do Salvador, é Mãe espiritual de todos os cristãos... assim também José considera, como confiada a si, a multidão dos cristãos... Ele é o defensor da Santa Igreja, que é verdadeiramente a casa do Senhor e o reino de Deus na Terra”.


O que surpreende nesse papel atual de José até o fim dos tempos é que ele une admiravelmente as prerrogativas aparentemente mais opostas. Sua influência é universal sobre toda a Igreja a qual protege e, não obstante, a exemplo da Providência, estende-se aos menores detalhes; “modelo dos trabalhadores”, está interessado em cada um dos que a ele acodem. É o mais universal dos santos por sua influência e, ao mesmo tempo, faz com que o pobre encontre o par de sapatos de que necessita. Sua ação é evidente, sobretudo, na ordem espiritual, mas estende-se também às coisas temporais; é “o amparo das famílias, das comunidades, o consolo dos miseráveis, a esperança dos doentes”. Vela pelos cristãos de todas as condições, de todos os países, pelos pais de família, esposos, bem como pelas virgens consagradas; pelos ricos, para inspirar-lhes uma caritativa distribuição de seus bens, bem como pelos pobres, para socorrê-los. Está atento aos grandes pecadores e às almas mais avançadas. É o padroeiro da boa morte e das causas desesperadas; é terrível ao demônio que parece triunfar, e é também ― diz Santa Teresa ― o guia das almas interiores nas vias da oração. 


Há em sua influência um reflexo maravilhoso da “Divina Sabedoria que se estende desde uma extremidade à outra do mundo, e governa todas as coisas com fortaleza e as dispõe com suavidade”³⁸. O esplendor de Deus esteve e permanece eternamente em São José; a graça não cessa de frutificar nele e quer fazer partícipes dela todos os que aspiram verdadeiramente “à vida oculta com Jesus Cristo em Deus”³⁹.


Notas


1. “Aquele que entre vós todos é o menor (pela sua humildade), esse é o maior (no reino dos céus)”. Lc 9, 48.

2. Sermo in Nativ. V. Mariae, IV consideratio.

3. Sermo I de S. Joseph, c. III. Opera, Lion, 1650, t. IV, p. 254.

4. Summa de donis S. Joseph, ann. 1522, nova edição do Pe. Berthier, Roma, 1897.

5. Summa S. Tomás, IIIª, q. 29, disp. 8, sect. 1.

6.Sermone di S. Giuseppe. Discorsi morali, Nápoles, 1841.

7.Saint Joseph intime, Paris, 1920.

8.Tractatus de Sancto Joseph, Paris, s. d. (1908).

9.La Grandezza di San Giuseppe, Roma, 1927, pp. 36 ss.

10.Epist. encyclica “Quamquam pluries”, de 15 de agosto de 1899: “Certe Matris Dei tam in excelso dignitas est, ut nihil fieri majus queat. Sed tamen quia intercessit Joseplio cum Virgine beatissima maritale vinculum, ad illam praestantissiman dignitatem, qua naturis creatis omnibus longissime Deipara antecellit, non est dubium quin accesserit ipse, ut nemo magis. Est enim conjugium societas necessitudoque omnium maxima, quae natura sua adjunctam habet bonorum unius cum altero communicationem. Quocirca si sponsum Virgini Deus Josephum dedit, dedit profecto non modo vitae socium, virginitatis testem, tutorem honestatis, sed etiam excelsae dignitatis ejus ipso coniugali foedere participem”.

11.“A cunctis nos quæsumus Domine mentis et corporis defende periculis: et intercedente beata et gloriosa semper Virgine Dei Genitrice Maria, cum beato Joseph, beatis Apóstolis tuis Petro et Paulo, et omnibus Sanctis, salutem nobis tribue benignus et pacem; ut destructis adversitatibus et erroribus universis, Ecclesia tua secura tibi serviat libertate. Per Dominum nostrum Jesum Christum Filium tuum, qui tecum vivit et regnat in unitate Spiritus Sancti, Deus, per omnia saecula saeculorum”.

12.Jo 1, 16: “Todos nós recebemos da sua plenitude graça sobre graça”. Cf. SANTO TOMÁS, IIIª, q. 7, a. 9.

13.Cf. ibid., q. 27, a. 5.

14.Cf. ibid., IIª IIae, q. 1, a. 7, ad 4.

15.Cf. santo tomás, Iª, q. 94, a. 3.

16.Cf. Dict. Théol. cath., art. Joseph (saint), col. 1518.

17.Hom. II super Missus est, prope finem: “Fidelis, inquam, servus et prudens, quem constituit Dominus suae Matris solatium, suae carnis nutritium, solum denique in terris magni consilii coadjutorem fidelissimum”.

18.Sermo I de S. Joseph: “Omnium singularium gratiarum alicui rationali creaturae communicatarum, generalis regula est: quod quandocumque divina gratia eligit aliquem ad aliquam gratiam singularem, seu ad aliquem sublimem statum, omnia charismata donet, quae illi personae sic electae et ejus officio necessariae sunt atque illam copiose decorant. Quod maxime verificatum est in sancto Joseph, putativo Patre Domini nostri Jesu Christi, et vero Sponso Reginae mundi et Dominae angelorum, quia ab aeterno electus est fidelis nutritius atque custos principalium thesaurorum suorum, scilicet Filii ejus et Sponsae suae: quod officium fidelissime prosecutus est... Si compares eum ad totam Ecclesiam Christi, nonne iste est homo electus et specialis, per quem et sub quo Christus est ordinate et honeste introductus in mundum? Si ergo Virgini Matri tota Ecclesia sancta debitrix est, quia per eam Christum suscipere digna facta est; sic proferto, post eam, huic debet gratiam et reverentiam singularem... Omnibus electis Panem de coelo, qui coelestem vitam tribuit, cum multa solertia enutrivit”.

19.Summa de Donis S. Joseph (obra muito elogiada pelo Papa Bento XIV), pars IIIª, c. XVIII. Todo esse capítulo expõe a superioridade da missão de São José sobre a missão dos Apóstolos. Ver também ibid, c. XVII “De dono plenitudinis gratiae (in S. Joseph)”.

20.Summa S. Tomás, IIIª, q. 29, disp. 8, sect. 1.

21.Cf. mons. g. sinibaldi, La Grandezza de San Giuseppe, Roma, 1927, pp. 36 ss.: “O ministério de São José e a ordem da União Hipostática... Maria nasceu para ser a Mãe de Deus... Mas o casamento virginal de Maria depende de José... De onde o ministério de José tem uma estreita relação com a constituição da ordem da União Hipostática... Celebrando sua união virginal com Maria, José prepara a Mãe de Deus, como Deus quer; e é aí que reside sua cooperação na atuação do grande Mistério. — Sua missão pertence, por seu fim, à ordem hipostática, não por uma cooperação intrínseca, física e imediata, mas por uma cooperação extrínseca, moral e mediata (por Maria); o que é ainda, no entanto, uma verdadeira cooperação”.

22.Lc 1, 26-27.

23.Cf. Santo Tomás, IIIª, q. 24, a. 1, 2, 3, 4.

24.In IIIam, q. 24, a. 1 e 2.

25.Mt 1, 20; item Lc 2, 5.

26.IIIª, q. 29, a. 2.

27.Primeiro panegírico de São José, segundo ponto, ed. Lebarcq, t. II, p. 135 e ss.

28.No Evangelho de São Lucas (Lc 2, 51) diz-se que o menino Jesus era “submisso” a Maria e a José. José, porém, em sua humildade, deve ter experimentado (como alguém disse) certa confusão em ser o cabeça da Sagrada Família, ele que era o mais imperfeito dos três.

29.Cf. bossuet, ibidem, no exórdio.

30.Segundo panegírico de São José, exórdio.

31.Lc 9, 48.

32.Primeiro panegírico de São José, exórdio.

33.Segundo panegírico de São José, ponto terceiro.

34.Tratado do Amor de Deus, 1. VII, c. XIII.

35.Mt 27, 52 ss.

36.IV Sent. 1. IV, dist 42, q. 1, a. 3

37.Cf. IIIª, q. 53, a. 3, ad 2.

38.Sb 8, 1.

39.Cl 3, 3.