A religiosidade popular, com sua riqueza simbólica, afetiva e comunitária, tem se mostrado, ao longo dos séculos, uma fonte profunda de alívio psíquico, fortalecimento interior e reorganização emocional, especialmente para pessoas que enfrentam condições difíceis e prolongadas. Ao contrário de uma religiosidade meramente doutrinária, a religiosidade popular é encarnada, sensorial, processual e afetiva. Nela, cada enfermidade, cada angústia pode ser vivida junto aos sofrimentos de Cristo, de Maria e dos santos – e assim se tornar redentora, fecunda e cheia de sentido.
O que é a religiosidade popular?
A religiosidade popular é uma forma vivencial da fé, nutrida por práticas devocionais, símbolos, festas, objetos sagrados, peregrinações, promessas, bênçãos, santos padroeiros, terços, romarias, novenas e procissões. É o modo pelo qual o povo, muitas vezes à margem dos sistemas teológicos ou acadêmicos, vive o sagrado em meio às dores da vida cotidiana. Ela inclui o terço rezado diariamente; as novenas e ladainhas em casa ou na comunidade; as imagens de santos nas paredes do lar; os panos bentos, escapulários, medalhas; as promessas feitas em momentos de desespero; as procissões de fé e de choro; as missas votivas, romarias penitenciais e confissões com lágrimas.
A religiosidade popular e a depressão resistente
A depressão resistente não é apenas uma tristeza profunda: é um estado de esgotamento emocional, perda de sentido, isolamento afetivo e vazio existencial que não cede facilmente nem com medicamentos nem com psicoterapia. A religiosidade popular oferece caminhos alternativos. A imagem de um santo – especialmente os mais humanamente sofredores, como Nossa Senhora das Dores, com sete espadas no coração; São Lázaro coberto de chagas; Santa Rita de Cássia, com sua ferida na fronte; São Judas Tadeu, padroeiro das causas impossíveis – funciona como um espelho emocional, em que o deprimido se vê representado, compreendido e acolhido. A novena, com sua sequência diária de orações, pedidos e meditações, introduz estrutura na vida desorganizada pela depressão. Ela cria um “tempo espiritual” que resiste à estagnação interna. O culto popular, com sua confiança radical no poder intercessor de Maria e dos santos, reabre o coração para a possibilidade do inesperado, para o poder do invisível, para a graça que rompe limites humanos. Essa abertura ao mistério pode representar um novo tipo de resiliência.
A religiosidade popular e a ansiedade crônica
A ansiedade crônica desorganiza o pensamento, ativa estados de alerta permanentes e gera um mal-estar contínuo. A religiosidade popular oferece ao ansioso rituais repetitivos como o rosário, a ladainha ou a via-sacra, que atuam como técnicas de autorregulação emocional, comparáveis à meditação ou à respiração guiada. O rosário, por exemplo, é uma espécie de “mantra” cristão: cada Ave-Maria é como uma âncora que fixa a mente no presente, tirando-a dos pensamentos acelerados. Medalhas, escapulários, imagens, águas bentas e terços podem funcionar como símbolos táteis que proporcionam segurança psíquica em momentos de angústia. Para muitos ansiosos, especialmente os que sentem o corpo “possuído” por tensões, dores físicas ou inquietações inexplicáveis, os ritos de libertação da religiosidade popular (como orações fortes, exorcismos leves, bênçãos com água benta) atuam simbolicamente como ritos de purificação emocional.
A religiosidade popular e o TDAH
O TDAH envolve impulsividade, desatenção, hiperatividade e uma dificuldade de manter rotinas e regular emoções. A religiosidade popular, com sua materialidade rica e dinâmica, oferece elementos que podem ser profundamente terapêuticos. Diferentemente de uma prática intelectual, a religiosidade popular envolve caminhadas em romarias e gestos repetitivos, como fazer o sinal da cruz e ajoelhar-se. Isso ajuda a integrar o corpo hiperativo. O TDAH frequentemente está ligado a uma mente imaginativa e sensível, mas que se dispersa facilmente. A religiosidade popular oferece um universo simbólico e narrativo abundante, com histórias de santos milagrosos, visões místicas, sonhos proféticos, aparições e sinais do céu. Mesmo com dificuldade em manter hábitos, o engajamento em pequenas rotinas religiosas diárias pode criar uma estrutura não opressora.
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