terça-feira, 31 de março de 2009

Esperança no meio do caos


Nos últimos meses, minha vida tem sido acossada por um verdadeiro vendaval, levada para lá e para cá. Esta é uma das razões pelas quais tenho me mantido calado. Calado e pensativo... tenho visto tantas coisas nestas últimas semanas que tenho ficado mais observando, calando e "auscultando" a realidade. A realidade da minha dissertação (já em vias finais - graças a Deus!) também tem me levado a me calar. Nos últimos tempos, tenho me dado conta do Mal e de como ele tem força em nossas vidas, da morte e da sua força inexorável, se a Ressurreição na manhã da Páscoa não tivesse sido um fato acontecido num preciso momento histórico da experiência humana.
Há alguns dias, um amigo me mandou em texto escrito por Dráusio Varela, defendendo o aborto na menina de Alagoinha (PE). O que me chocou, lendo, não foi a posição dele, em tese, cada qual é livre para defender o que quiser, mas o que chocou e entristeceu foi o cinismo e a arrogância, a inverdade, a ignorância, a mentira e a hipocrisia escritos num texto que respinga a cinismo e niilismo do início ao fim.
Hoje ficamos a nos perguntar porque estamos vivendo em tanta violência. Eu mesmo que nunca fui de ter medo já tenho medo de sair na rua e ser assassinado, ou receber uma bala perdida, como aconteceu na Vasco da Gama e não é verdade que isso é devido à pobreza, porque os indicadores sócio-econômicos têm melhorado ano a ano, e o Brasil está enfrentando relativamente a crise financeira.
Então, o que tem acontecido? Para mim, é cada vez mais evidente que o grande problema é a mentalidade de niilismo e cinismo que tem se espalhado por meio dos adultos, gerando desnorteamento e desespero, especialmente nos jovens. Sem esperança, não se vive, ela nos é mais necessária que o ar. Eu sou extremamente grato ao Papa Bento XVI, e o amo, porque ele me dá as razões para esperar e poder enfrentar as canseiras do dia-a-dia, num mundo que cada dia mais afoga no nada, no vazio e no desespero, na ignorância, na estupidez e na corrupção das mentes e dos corações.
Uma das coisas que mais me entristecem é mesmo o cinismo. Elsimar Coutinho, comentando sobre o aborto, vem, cinicamente, dizer que "o espermatozóide e o óvulo são vida" e "a menstruação é aborto" e "por que a Igreja não é contra a menstruação?" É essa mentalidade de estar fazendo pouco caso e gozação com as coisas mais importantes da realidade (a vida), de não reconhecer o valor inalienável e irrenunciável da vida, que gera toda essa violência, porque a defesa da maior de todas as violências, que é o aborto, o assassinato frio do ser mais indefeso que existe, que é a criança não-nascida no ventre da mãe, toda essa onda pró-aborto que tem se levantado, sem a menor sombra de dúvidas, é a razão pela qual a violência tem se espalhado, em virtude de fazer predominar uma mentalidade na qual a pessoa para para ser acolhida precisa atender a determinados critérios (como ser saudável ou nascer em ambiente com uma certa situação sócio-econômica), num clima que aceita e olha para a vida como algo banal e descartável, no qual o sujeito não existe "em si mesmo", como uma pessoa única e irrepetível, mas nada mais é do que um ator social, alguém que está ali somente para representar um papel social e nada mais, e que portanto, pode muito bem ser trocado por um outro ator, que convenha mais a esta sociedade do espetáculo! As teorias sociais não dão conta da profundidade humana, justamente por terem se limitado à superfície do fenômeno humano, são superficiais e porque não dizer, vazias, na maioria dos casos; a sociologia não explica "quem sou eu", chega a ser nefasta, porque para ela, é como se nós fôssemos somente atores segurando uma máscara, que no fundo, para ela, é vazia! Mas não é verdade, a experiência humana mostra que o homem é muitom mais do que a sociologia pode dizer, explicar ou legitimar com seus sofistas intelectuais. O homem é sede inesgotável de infinito, é isso o que a realidade mostra. É isso que é documentado em toda a arte e literatura, nos quatro cantos da Terra, o homem não se reduz a um conjunto de necessidades, como água, comida, habitação e sexo, mas é desejo de felicidade, morada, amor e beleza! O homem não se reduz a necessidades materiais, mas é sede de infinito!
Numa sociedade sem esperança, sem o reconhecimento de que a vida em si mesma é um bem, na qual os nossos desejos mais profundos, em nome da edificação de uma sociedade perfeita na qual ninguém precise ser bom, são nivelados por baixo e achatados ao extremo, na qual o nosso destino de felicidade é simplesmente rejeitado e tratado como uma mera quimera, abrem-se todos os espaços para a fúria e a revolta, frutos da insatisfação estrutural contra esta sociedade que é edificada para o poder e contra o homem.
Mas tudo isso não é a última palavra! Eu posso esperar porque dentro de toda essa loucura existe uma outra realidade, que é discreta, mas é vitoriosa! Eu a vi em Nova York, quando abracei Vicky, uma aidética que recuperou o desejo de viver depois que uma amiga lhe disse: "você vale mais que sua doença", eu a vi lá na Universidade Federal de Sergipe, em Aracaju, onde passei dois dias, onde vi, num departamento de sociologia, se abrirem espaços para se falar da prática da Igreja como "amor" e compará-la com a dádiva de Marcel Mauss, eu a vi em São Paulo, na Associação dos Trabalhadores Sem Terra, num movimento fundado por Cleuza Ramos, que, respondendo operativamente às provocações da realidade, pôde conseguir casas para cerca de 17 mil famílias, edificar inúmeros bairros e fazer com que 50 mil jovens estivessem na universidade! Vi em rostos e em olhares. Esta realidade é a mesma que ressuscitou Jesus na manhã da Páscoa e se faz presente dentro desses rostos e desses fatos, uma realidade nova, marcada não pela violência e pela morte, mas pela acolhida e pela vida. Como disse Dom Geraldo numa entrevista na Band há alguns anos: "Se o espírito do mal está trabalhando, o Espírito de Deus também não está parado" e, pelo menos a mim, é dada a graça de ver essas coisas. É daí que vem a minha esperança e o meu desejo, de que essa realidade cresça, porque é a vida, vida que nos satisfaz e nos faz felizes! Vida que me faz dizer, em cada domingo da Páscoa: "o Senhor está vivo! Ressuscitou do sepulcro, para sempre, para não morrer jamais! Aleluia!"