sexta-feira, 20 de junho de 2008

Canto noturno de um pastor errante da Ásia

Giacomo Leopardi

[...] Mas tu, sozinha, eterna peregrina,
Que tão pensativa és, talvez entendas
Este viver terreno,
O sofrer nosso, o suspirar, que seja;
Que seja este morrer, este supremo
Descorar do semblante,
E da terra sumir, fugir do aceno
Da habitual, amante companhia,
E decerto compreendes
O segredo das coisas, vês o fruto
Da manhã e da noite,
Do tácito, infinito andar do tempo.
Sabes, por certo, a qual doce amor seu
Sorri a primavera,
A que, o estio é útil, a quem serve
O inverno e a sua neve.
Mil coisas sabes tu, e mil descobres,
Que estão ocultas ao pastor simplório.
Amiúde, ao te ver
Muda assim sobre campos que, desertos,
Lá na distância com o céu confinam;
Ou então a viajar
Comigo e meu rebanho tão de perto;
E quando olho a amplidão, de estrelas cheia,
Penso e digo comigo:
Por que tanta candeia?
Por que estes ares infinitos, este
Infinito profundo, sereno, esta
Imensa solidão? E eu, que sou eu?
[...]