sábado, 23 de agosto de 2008

O que pode unir as pessoas?

Uma das músicas que eu mais gosto é a música High Hopes, do Pink Floyd. Lá se fala de "altas esperanças". Que altas esperanças são estas? Qual é a verdadeira esperança para cada um em particular e para a humanidade como um todo? A unidade, a amizade, como eu gosto de falar, ou para quem preferir, a palavra francesa, fraternidade.
A única esperança para o mundo é esta unidade da humanidade. Mas vivemos numa época muito difícil, porque em nome da afirmação de particularismos e visões de mundo, fomenta-se a divisão. Hoje em dia, as pessoas são cada vez mais sós, porque se repararmos no que chega até nós, ressalta-se cada vez mais a divisão, aquilo que nos separa: primeiro, as classes sociais, depois o gênero, a cor, a nação, a orientação sexual etc.
O cristianismo é o inverso de tudo isso. É a afirmação de que todos são uma coisa só. É tremendo o que o apóstolo Paulo fala na Carta aos Gálatas: "Não há mais judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher [hoje em dia poderíamos dizer não há mais direita nem esquerda], todos são uma coisa só em Cristo Jesus" (Gl 3, 27). Esta é a maior revolução que já aconteceu. Num mundo envolto em mil guerras, oprimido pelo Império Romaano, um homem (que era louco ou era o próprio Deus que "rasgou os céus" e veio estar com os homens) mandou a todos amar uns aos outros e construir comunidades por todo o mundo conhecido. Um outro homem (o apóstolo Paulo), que também, ou fez um encontro verdadeiro, ou era maluco do mesmo jeito, foi a todo o Império, percorrendo mais de 4000 quilômetros a pé espalhar esta novidade no meio da guerra eterna e da opressão sem fim, de que a havia um só Deus e que a humanidade era uma só, até que foi decapitado no ano de 67 d.C. a mando do imperador Nero. Paulo foi a todo o Império para espalhar a dignidade da pessoa humana. A partir de então, todos deviam ser considerados (até isso, só era cidadão o civis romanus, o homem que detinha todos os direitos).
A presença cristã é especialmente ecumênica e católica (do grego -kato: para; -holo: todo; para todos, totalizante ou universal). É só ela que pode gerar unidade na humanidade, porque parte não de particularismos ou contingências, mas do que é inerente a todo homem e mulher: a própria exigência de felicidade e satisfação, tão comum a nós, que através dela nos reconhecemos em escritores ou artistas de eras longínquas ou em pessoas que habitam em terras tão distantes quanto a China e o Japão. Dado que a novidade cristã não é uma doutrina sobre o que foi ou que será da alma humana, como nos diz o filósofo Wittgenstein, mas um acontecimento: o próprio Deus que se faz homem e entra na nossa história, tornando-se fator dela, podemos encontrar a todos e estabelecer esta unidade que como diz o grande apóstolo Paulo é ansiada até mesmo pela natureza: "a criação aguarda ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus. Pois a criação foi sujeita à vaidade (não voluntariamente, mas por vontade daquele que a sujeitou [o homem]), todavia com a esperança de ser também ela libertada do cativeiro da corrupção, para participar da gloriosa liberdade dos filhos de Deus. Pois sabemos que toda a criação geme e sofre como que dores de parto até o presente dia." (Rm 8,19-22).
Esta possibilidade de união entre as pessoas - única em toda a História - é o que chamamos de "Igreja" (ekklesia, em grego: assembléia ou reunião) e que converteu o cantor David Gilmour, do Pink Floyd. A justiça (que é dar a cada um o que lhe é de direito) a partir de então, não é mais aquilo que eu faço para consertar o mundo, mas é reconhecer aquilo que o Mistério faz para tanto, é a . não é uma coisa subjetiva, é reconhecer as obras que Deus, o Mistério faz no mundo, há 2000 anos ou seja, Jesus e a Sua Igreja. A prova mais viva de que tudo isso é verdade é amizade e a unidade entre os cristãos. O que converteu o mundo antigo foi o estupor diante da amizade entre os cristãos: "Vejam como eles se amam!", se maravilharam as multidões pagãs! Desde que Deus resolveu se fazer homem, a justiça neste mundo é a fé, que gera uma amizade incomparável, construção, paz, vida, alegria, satisfação, felicidade ... como só é possível dentro de uma amizade universal, como é a Igreja. A justiça é a fé. “O meu justo vive por sua fé.” (Hb 2,4.) Reconhecer tudo o que de bom esta presença trouxe ao mundo e ainda trará.

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