domingo, 5 de outubro de 2008

A percepção do devir

Alguns fatos têm me provocado a me lançar agora nessas "meditações políticas". O primeiro foi ontem, quando quase fui agredido fisicamente na Avenida Sete e na Vitória. E hoje, o fato de ter sido presidente da seção 223 da Zona 001, na Faculdade de Direito e ter encontrado o professor Carlos Milani e a professora Marie-Françoise Durand (da Science-Po, Paris)caminhando na Graça. Milani é política, Durand é política. Hoje o meu dia foi embebido em política. Como não pensar em política se esta, como diz Michel Foucault está até em nosso corpo e "quem não gosta de política é governado por ela".
O grande risco de tudo isso é o que eu já chamei em alguns meses de redução política, reduzir o mundo da vida somente à política. Da mesma forma que o neoliberalismo (a loucura com método - a crise americana nos deixa de cabelo em pé quanto à loucura do cassino global) tenta reduzir tudo à economia (por incrível que pareça o marxismo faz a mesma coisa quando põe a ontologia do homem no seu fazer-se, o homem produzindo-se a si mesmo por meio do trabalho), também a ideologia pode reduzir tudo à política, tudo ao poder.
E hoje eu estava pensando em como eu estava nestas eleições e minha relação com a política. Tudo isso porque eu não espero mais a salvação da política, como antes, nem mais de um lado nem de outro. Nem da esquerda, mas também não da direita. Comentando com um amigo entusiasta da direita, eu disse a ele: "pra mim não existe nem a esquerda nem a direita, mas somente a Cruz". Ele ficou escandalizado quando ouviu isso, e de uma certa forma, nem eu mesmo estava entendendo o que eu estava dizendo, coisa que eu só entendi agora e por isso estou escrevendo este post.
Eu saio triste destas eleições, é um fato. Não porque meu candidato provavelmente não vai ganhar (por que se fosse, e daí? Saramago, inteligentemente quando ganhou o prêmio Nobel de Literatura, disse: 'ganhei o Nobel! E daí?'), mas porque de que adianta eu ganhar o mundo inteiro e perder a mim mesmo? Que adianta "ganhar as eleições" e não fazer nada de participar da velha luta pelo poder que é tão velha quanto andar pra frente, a tal ponto de Aristóteles chamar o homem de "animal político"? Que adinata "ganhar" e "me perder"? Porque a única forma de não me perder é a afirmação do ser, e portanto, da liberdade.
Vendo o debate da Rede Bahia na quarta e percebendo a re-arrumação do poder na Bahia após a morte de ACM, eu percebo cada vez mais claramente o que é este fluxo do poder e o devir, e como o indivíduo, se a sua pessoalidade não é afirmada (e o é somente por meio da religiosidade, somente!) é somente pó e cinza no decorrer da História e do avanço impessoal e implacável do devir. E como o devir é terrível, porque a afirmação do devir é a afirmação de um poder gigantesco (a "Idéia" que é o Deus hegeliano todo-poderoso e implacável e que por fim reduzirá todos nós a nada em nome da afirmação de si própria).
Na minha seção votou o irmão de João Amazonas (que foi durante muitos anos presidente nacional do PC do B), de 92 anos, e uma mulher disse: 'ele só vota no PC do B'. Eu olhei para ele e o respeitei do alto dos seus noventa e dois anos e pensei 'meu Deus, esse cara apostou a vida nisso, se o comunismo estiver errado ele está fudido, porque apostou a vida numa mentira, e se estiver certo, também está fudido, porque vai morrer e não o verá realizado, é injusto!' E eu me enchi de tristeza...
Minha cabeça está assolada de "pensamentos políticos", eu diria, porque mesmo esperando a Cidade Celeste, desejo contribuir para edificar a Cidade Terrena, a afirmação da Cidade Celestial não pode ser um pretexto para alienar-me da Cidade Terrestre. Mas aí meu espírito se povoa de dúvidas: o que é mesmo o poder? Como se expressa e acontece? Quais os limites a ele e quem lhe impõe? Como pode acontecer a justiça em relação ao Estado? (porque o Estado é um bem, embora carregue dentro de si uma ambivalência monstruosa que pode degenerar em totalitarismo) E como viver política com liberdade, sem esperar dela a salvação da vida, colocando-a em seu justo lugar na totalidade do mundo da vida? E como defender, propagar e fazer crescer a democracia, que é como diz Churchill "a pior forma de governo, exceto todas as outras que têm sido tentadas de tempos em tempos"? Bom, essas são somente inquietações, para as quais não tenho respostas no momento. Quem sabe, com o tempo, elas vão aparecendo e sendo divulgadas neste humilde espaço...

2 comentários:

Vinícius Mascarenhas disse...

Pode até ser uma coisa periférica no texto, mas o comentário sobreo senhor de 92 anos foi muito bom. Parabéns!

Vinícius Mascarenhas disse...

Pode até ser uma coisa periférica no texto, mas o comentário sobreo senhor de 92 anos foi muito bom. Parabéns!