sábado, 6 de dezembro de 2008

Algumas reflexões antes do Natal

Acho que a 1ª e fundamental pergunta a se fazer é: o que fé? E o que é a razão? Porque senão a gente tende a pensar com base em preconceitos sutilissimamente impingidos a nós pelo poder. O que é a razão? Segundo o pensamento católico, razão é a capacidade de dar-se conta da realidade segundo a totalidade dos seus fatores. A mentalidade iluminista reduziu o conceito de razão a medida de todas as coisas (um conceito sofista, anterior a Sócrates, diga-se de passagem), enquanto que Santo Tomás na Suma Teológica define a verdade como a correspondência entre a inteligência e a realidade.
Qual o instrumento que Deus nos dá para o reconhecermos? A realidade! A realidade grita Deus, porque não se faz por si mesma. Diante da realidade, ou fazemos como Sartre, e escolhemos o nada, e portanto, o absurdo, ou reconhecemos que a realidade não se faz por si mesma, que se origina em uma fonte misteriosa. A esta fonte misteriosa, os povos chamaram de o Mistério tremendo e fascinante. Todas as religiões partem deste maravilhamento, de que o real não se faz por si e que vem de uma fonte misteriosa. Todas as religiões são uma tentativa do homem de chegar até o Mistério. Mas como diz Santo Tomás, o homem não consegue chegar à verdade sem grandes erros, e vemos de tudo, em quem conhece minimamente o universo religioso. E mesmo o não-religioso, porque, como diz o teólogo Romano Guardini, todos os movimentos do homem são em busca do "deus", e o que é mais sacrificado na modernidade avançada é a razão. Quanto mais a fé cristã diminui, é o irracionalismo que avança, e não o racionalismo. A tentativa de transformar a fé em mágica, a new age e diversos espiritualismos são a prova mais viva disso.
É necessária uma revelação, afirma Santo Tomás (e Platão no Fédon). Seria impossível o homem conhecer a Deus se Ele não se revelasse. O anúncio cristão é que Deus Se revelou. Ele respondeu ao grito do profeta Isaías: "Ah, Senhor! Se Tu rasgasses os céus e descesses!" (Is 61) E Ele rasgou! O nascimento de Cristo na noite de Natal é isso. Cristo é o Verbo - o Logos, a Razão - feita carne: Verbum caro factum est! (cf. Jo 1,14) O cristianismo é o caminho verdadeiro não tanto porque os outros são falsos, mas porque é o caminho traçado pelo próprio Deus.
Cristo permanece presente na Igreja. O método para conhecer Jesus é conhecer a Igreja. A Igreja é a contemporaneidade de Cristo. Ela é a esposa de Cristo, nela Cristo Se faz presente. Não há outro método para conhecer Cristo senão conhecer a Igreja. por isso, o Concílio Vaticano II a chama de "Sacramento - que significa sinal visível da graça invisível - de Cristo" (a Igreja torna Jesus presente). Como? Através de uma humanidade que seria impensável sem Cristo.
Além dos casos de martírios e santidade extraordinárias, e dos inúmeros milagres registrados na vida da Igreja ao longo de vinte e um séculos - e somente nela - mesmo na vida ordinária, habitual, comum, podemos ter exemplos: pensemos nas pessoas que consagram a sua vida a Cristo, vivendo em pobreza, virgindade e obediência por toda a vida, ou casamentos que duram a vida inteira, homens e mulheres que dedicam a sua vida inteira - muitas vezes com muito sacrifício - à própria família. Estas realidades não existiam antes do cristianismo. E à medida que o cristianismo declina, elas declinam junto com ele.
A fé - como diz o papa Bento XVI - é uma obediência de coração a uma verdade que nos foi revelada. Por quem? Por um outro. A fé é aderir ao que um outro diz. Quem é este outro? Cristo e a Igreja. A fé é aderir ao que Cristo e a Igreja dizem. Como pode ser razoável? Se eu olho a Igreja e vejo um algo a mais, uma humanidade plena e diferente para melhor, jamais observável em nenhuma religião - quando as conhecemos em profundidade reconhecemos especificidades presentes somente no cristianismo (como a palavra "graça" - que significa favor imerecido da parte de Deus para nós), e portanto podemos dizer: aqui tem algo, aqui habita o Mistério. E posso crer no que me dizem Cristo e a Igreja.
Quando Jesus multiplicou os pães e saciou a fome de cinco mil pessoas às margens do mar da Galiléia, eles queriam fazer de Jesus um rei porque pensaram: "agora, meus problemas acabaram com este cara!" Mas Jesus se retirou, e fugiu para a Sinagoga de Cafarnaum. A multidão foi atrás dele e ele disse: "Vocês vieram atrás de mim por causa do pão que eu dei pra vocês! Trabalhem não pela comida que perece, mas pela que dura até a vida eterna! O pão que eu darei é a minha carne, para a vida do mundo, porque se vocês não comerem o Meu corpo e o Meu sangue não terão a vida em vocês mesmos!" Aí todo mundo disse que ele era louco e foi embora. Qual foi a posição mais razoável, a de Pedro, que questionado por Jesus: "Vocês também não querem ir embora?", disse "Senhor, só Tu tens palavra que explicam, que dão significado à vida. Se formos embora, a quem iremos?", ou da multidão que fugiu só porque não entendeu? A fé é justamente dar crédito a esta correspondência que experimentamos. Se um cara faz um milagre, alimenta cinco mil pessoas com cinco pães e dois peixes, e depois diz: "Eu sou Deus! Eu sou o pão da vida! Sem Mim, nada podeis fazer!" É razoável ou não dar crédito a esse cara?
Mas tudo isso precisa da nossa razão, batalha que o papa Bento XVI vem travando desde Regensburg (2006). A nossa razão precisa ser alargada porque está obtusa e acanhada, e é incapaz de reconhecer o Mistério presente porque ele transborda todas as nossa medidas. Mas quem está certo? O Mistério que veio ao meu encontro por meio da Sua Amada Igreja - Jesus - ou os jornalistas, os intelectuais e os professores universitários, que o negam dia a dia? Quem é que me faz mais feliz, mais alegre, mais bom, melhor enfim, que me enche de esperança, de paz, de amor e vida? É razoável ou não dizer "sim" a Jesus? Eu O amo, porque Ele teve piedade do meu nada e salvou e salva a minha vida.

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