sexta-feira, 23 de julho de 2010

O sucesso de Eclipse e a cultura da morte

A saga Crepúsculo, do qual Eclipse é o terceiro livro e filme está fazendo um sucesso tremendo entre os adolescentes. Basta notar, para se dar conta disso, o número de salas que estão exibindo o filme e a quantidade de pessoas que já o assistiram ou ainda vão assistir. Há alguns dias vi no Twitter uma pessoa que twittou assim: "vou assistir agora a Eclipse para comemorar o término da escrita do meu artigo".

A pergunta que eu me faço diante desses fatos é a seguinte: qual a razão desse sucesso tão estrondoso, que não é somente objeto da moda ou fruto da "imposição cultural americana"? Acusar Eclipse disso é uma superficialidade gigantesca. O fenômeno Eclipse não é algo superficial ou meramente ideológico, como pensam alguns, taxando de "alienação" o seu consumo em massa. Eclipse faz sucesso por uma razão muito simples: ecoa os anseios do coração humano, ecoa os anseios do coração dos adolescentes, que é a fase no qual está mais premente a emergência dos desejos mais profundos do coração humano. Dizendo de outra forma: Eclipse faz sucesso porque encontra, no coração adolescente, uma tremenda correspondência.

Um amigo me disse que o sistema capitalista faz sucesso porque "joga" com os desejos do coração, mercantiliza-os, tenta reduzi-los a uma mercadoria que supostamente iria satisfazê-los, joga com o fenômeno que a Bíblia condena taxando-o de "idolatria", aquilo que não mantém as promessas para as quais parece feito.

Um desejos mais latentes no nosso coração é justamente a liberdade. É aqui que se encontra o fascínio exercido pela saga Crepúsculo. A libertação de uma vida que oprimiria os nossos desejos mais profundos se daria por meio da absurda "imortalidade por meio da morte", que é exatamente o inverso da Ressurreição acontecida na Páscoa. O vampirismo exerce um fascínio quase irresístivel porque joga com o nosso desejo de liberdade, imortalidade e juventude. A morte, a passagem para a "vida vampírica", é vista aqui não como "o último inimigo a ser vencido", como afirmou o apóstolo Paulo, mas é diabolicamente apresentada como "a solução de todos os problemas". Não é à toa que o símbolo da saga é a "maçã", símbolo da falsa promessa feita pela serpente a Adão e Eva. Trocando em miúdos, isto significa que o fascínio que Eclipse exerce expressa o fascínio exercido pela morte e pelo nada, no tempo pós-moderno que nega a realidade e aquilo que existe, pregando o refúgio no escapismo de sonhos, fantasias e estados mentais perturbados.

Um dos livros mais emocionantes que eu li foi Drácula, de Bram Stocker. Li 400 páginas em apenas uma semana. Eu estava numa fase difícil da minha vida, e toda aquela treva de alguma forma me atraía. Foi só começar a experimentar "uma febre de vida" que estas coisas deixaram de me atrair. Porque é assim que acontece com quem leva minimamente a vida a sério, e se deixa interpelar pelas próprias exigências de verdade, felicidade, justiça e amor. Mas nossa época, que tenta a todo custo sufocar as exigências mais elementares do coração, se configura como o tempo da banalidade e do cinismo. A pós-modernidade é verdadeiramente o tempo de surgir uma saga como Crepúsculo, que na verdade é um "vampirismo adocicado", ou um "niilismo soft". Exatamente o inverso do niilismo explícito da Lady Gaga, mas no fundo é a mesma coisa. A evidência disso é o sucesso de ambos. A única realidade que derrota o pós-moderno é uma amizade que não tem medo do nosso coração, que nos desafia sem cessar, e que nos obriga a levarmos a nós mesmos a sério. Esta amizade é a derrota do pós-moderno e a realidade mais temida por aqueles que detém o poder hodiernamente.

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